Palmas de um público distante

Por Karin Del Nóbile

Sem pretensões de palmas ao final da apresentação, a troca de experiências acontece naturalmente. É assim que funciona o projeto “Curta a Sua Orquestra”, idealizado no início do ano de 2014 pelo Maestro e Diretor Artístico da Orquestra Sinfônica de Ponta Grossa (OSPG), Jorge Scheffer.

O intuito é envolver deficientes físicos e visuais, autistas, idosos, crianças de escolas públicas e demais públicos em concertos e outras práticas de familiarização com instrumentos musicais. As apresentações se iniciaram com a participação dos 55 músicos que a OSPG tem hoje, eles se reuniam no Teatro PAX e ali mesmo, no palco estreito, faziam dois concertos contra turnos para crianças de escolas públicas da cidade.

O tubista e integrante do quinteto de metais da orquestra, Pierre de Cerjat, diz que a organização era feita desse jeito por ser mais didático. O concerto se dividia em duas partes, manhã e tarde, “onde eram apresentados os instrumentos, falávamos um pouco de cada instrumento, de cada ‘nipe’ das cordas, dos metais e da percussão”, explica Pierre.

A didática foi mudando com o tempo, conforme a demanda que o projeto recebeu de visitar instituições de diversas áreas em Ponta Grossa e região. O grupo de 55 pessoas se dividiu em categorias e, hoje, o quinteto de metais, o quinteto de cordas e grupo da percussão vão separadamente a cada visita.

Com um ano de atuação, a OSPG já atendeu 12 instituições por Ponta Grossa. Entre elas, a Associação de Deficientes Físicos de Ponta Grossa (ADFPG), Programa Social Transformando Gerações, Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), Associação de Pais e Amigos dos Deficientes Visuais (APADEVI) e Hospital Pequeno Príncipe de Curitiba.

A ideia surgiu com experiências profissionais do próprio Maestro, que trabalhou de 2006 a 2008 em uma Orquestra de São Paulo. Segundo Scheffer, “os projetos educacionais das orquestras do Estado de São Paulo são muito fortes”, lá tem o maior projeto educacional da América Latina, explica, conhecido como “Projeto Guri”, que tem como base os mesmos princípios propostos pelo “Curta Sua Orquestra”, que é trazer a educação musical para pessoas que não teriam essa oportunidade normalmente.

O Spalla e violinista da OSPG, Dhiego Lima, comenta que a diferença na recepção entre um concerto e o projeto é enorme e bastante perceptível. Com família e moradia em Curitiba, Dhiego tem uma técnica singular e ocupa o lugar mais importante do grupo depois do Maestro. Com isso, Lima relata que em concertos da Orquestra Sinfônica de Ponta Grossa, o público vai com olhos de avaliação e julgamento, pois são pessoas que, na maioria das vezes, já tem uma bagagem grande sobre música clássica.

“A diferença é enorme. O concerto no teatro, sentamos, tocamos o nosso melhor e ganhamos um parabéns no fim. Nesse projeto tocamos, conversamos e no fim ganhamos abraços verdadeiros, sorrisos impagáveis e uma sensação de que nosso mundo ainda tem esperança”, relata o Spalla.

O berço da oportunidade

A Orquestra Sinfônica de Ponta Grossa foi fundada em 04 de julho de 1954, apenas 14 anos depois da mais importante Orquestra do Brasil, a Orquestra Sinfônica Brasileira, com sede no Rio de Janeiro.  Em sua formação inicial, a OSPG tinha apenas oito músicos amadores e teve como primeiro Maestro o Tenente Paulino Martins Alves.

A perspectiva era unir o amor dos oito fundadores pela música e aprofundar ainda mais seus conhecimentos sobre artes. Atualmente, a OSPG é mantida pela Prefeitura Municipal de Ponta Grossa na forma de unidade administrativa de natureza cultural, além de ser administrada pela Fundação Municipal de Cultura tendo como função principal, a arte de ensinar, discutir e promover a difusão cultural da arte musical.

Os músicos da OSPG ficam apenas um ano na função, pela validade do edital. Depois desse período, os interessados, já dentro da Orquestra ou não, precisam se inscrever e passar por novas avaliações. Só depois delas é que são escolhidos os novos músicos do corpo que representará a cidade em concertos.

A temporada da Orquestra Sinfônica de Ponta Grossa apresenta-se com concertos regulares, recitais de música de câmara (quarteto de cordas, quinteto de metais e quinteto de sopros) e pelo projeto “Curta Sua Orquestra”.

O público dos concertos da OSPG, hoje, são a jovens, adultos e idosos que se interessam por música clássica. Crianças, apenas as que possuem algum grau de parentesco ou amizade com algum dos músicos. E é evidente a ausência do público alvo do projeto “Curta Sua Orquestra”, por isso, para Jorge o projeto representa uma estrutura social de ensino musical para pessoas que não têm acesso a música clássica.

 

O projeto começou a sonhar

O Maestro e Diretor Artístico da Orquestra de Ponta Grossa, Jorge Scheffer é calmo ao falar do seu trabalho e formação, com amor e vontade por fazer a diferença. Nascido em Ponta Grossa no dia 05 de maio de 1973, ele iniciou na música apenas 10 anos depois, na banda do Colégio Marista Pio XII.

“Essa banda me motivou muito, pois ela possui uns instrumentos que sempre me chamaram muito a atenção: o trompete, trombone e a tuba”, comenta o Maestro. Por conta disso, na quarta série do Ensino Fundamental, Jorge fez alguns testes para tocar na banda, mas não passou. “Eu fiz teste para corneta, para surdo e para caixa. Na época eu não passei e me senti”, relata.

Isso fez com que Jorge se empenhasse ainda mais na música. Aos 11 anos ganhou seu primeiro trompete de presente do pai, a escolha se deu pela afinidade com o instrumento, já que um colega de classe tinha um e emprestava para Jorge. “Essa foi a semente, eu ter um instrumento em casa. Mesmo o meu pai não tendo muitas condições para comprar, acho que minha insistência foi tanta que ele cedeu”, conta.

O pai de Jorge tocava acordeão e aos12 anos dele, levou-o com os irmãos à antiga loja “Hermes de Macedo” e deixou que cada um dos três filhos comprasse um LP, em função de uma recente aquisição: uma vitrola.

“Eu escolhi Tchaikovsky!”, lembra. O LP ainda existe e está entre um dos objetos pessoais do Maestro, representando o início da trajetória nos estudos de música.

O Conservatório e a Banda Lyra dos Campos marcaram sua trajetória de formação acadêmica. Esses estudos o qualificaram para voltar ao Colégio Marista, dessa vez, como professor. Sua trajetória no colégio durou 14 anos, momento que julga bastante importante para a sua história.

Simultaneamente às aulas de música, Jorge passou no concurso de sargento músico da Aeronáutica Brasileira com apenas 20 anos, ficando lá por mais 20 anos. Paralelamente a Aeronáutica e as aulas do Marista, os estudos foram concluídos na Escola de Música e Belas Artes do Paraná, com graduação e especialização. Hoje, Jorge também é mestre em educação musical pela Universidade Federal do Paraná.

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