Por Nathalia Oliveira
Feriado nacional, o carnaval é uma data comemorada no país desde a chegada dos portugueses e a cada ano se transforma. A afobação e a correria fazem parte dos bastidores das escolas de samba que participam dos desfiles de rua das cidades brasileiras. Ponta Grossa não se exclui. Atualmente a cidade possui três escolas de samba em atividade, e são mais de dois séculos de tradição carnavalesca e muitos desafios.
A professora Silvia Julek diz que o maior problema do carnaval da cidade sempre foi a falta de verbas e organização. “O Carnaval de rua foi perdendo, dentro da nossa sociedade, seu verdadeiro sentido de festa”, afirma. Silvia ressalta que há um caráter de preconceito da população quanto ao carnaval de rua e que muitos preferiam ir a festas fechadas, nos clubes.
Atualmente, a Avenida Vicente Machado – local onde acontece o desfile anual – recebe as três escolas de samba: Ases de Vila, Águia de Ouro e Globo de Cristal. Mesmo sendo uma competição, nos preparativos para a data o clima é de amizade e companheirismo, já que todas passam, em algum momento, pelas mesmas dificuldades. O carnavalesco da Águia de Ouro, Anderson Pedroso, explica que muitas vezes o dinheiro do prêmio é usado para auxiliar todas as escolas.
Todos os anos, após o Desfile das Campeãs do Rio de Janeiro, as escolas de Ponta Grossa vão até a cidade maravilhosa para arrecadar fantasias usadas no carnaval. “É usado o prêmio do concurso de rua da cidade para pagar o deslocamento dos membros das escolas”, afirma Pedroso. Segundo o carnavalesco, a quantidade de fantasias desperdiçadas é gigantesca e há a possibilidade de reutilizá-las no carnaval ponta-grossense no ano seguinte.
Tudo que precisa ser produzido pelas mãos dos próprios integrantes é feito durante o ano. A carnavalesca da Globo de Cristal, Delvana Bueno, explica que o seu trabalho no grupo começa logo após cada carnaval. “Já começo a escrever o samba-enredo em março. Depois de pronto, começo a montar as alas e fantasias. Primeiro desenho e então começo a procurar tecidos para confeccioná-las”, conta Delvana.
A carnavalesca conta que não é fácil ter auxílio e que “a escola trabalha o ano todo para tentar conseguir o apoio de empresas locais e melhorar o orçamento”. Delvana afirma que, mesmo realizando eventos para arrecadar fundos, o maior objetivo é divertir a comunidade. “Fazemos muitas festas com o intuito de manter a nossa comunidade unida. Muitos moradores ajudam e desfilam pela escola também”, explica Bueno sobre a escola localizada na Vila Mariana há mais de 40 anos.
Participante da escola de samba Águia de Ouro, Elicene Stolle, a comunidade é um fator muito importante para que se produza um carnaval com qualidade. Segundo ela, a construção de um carro alegórico, por exemplo, que custaria mais de R$15 mil por meio da contratação de uma empresa, é feita pela comunidade, que se voluntaria para ajudar.
Alegoria Financeira
Parte da verba utilizada para a preparação do carnaval de rua é repassada pela Fundação Municipal de Cultura. Este ano, em novembro, a Câmara Municipal de Vereadores abriu votação para o repasse de R$60 mil para a Liga das Organizações Carnavalescas. A sessão, intensa e tumultuada, contou com um enorme debate entre vereadores com diferentes pontos de vista.
O vereador Ezequiel Bueno (PRB) manifestou-se contra a aprovação, pois, segundo ele, a cidade deve investir em outras áreas, com maior prioridade. “Enquanto for vereador, não admitirei dar dinheiro para o carnaval”, afirmou. Houve também uma discussão em torno do abuso de drogas e álcool que a data comemorativa pode alavancar.
Rei Momo eleito em 2015, André Zaniolo acompanhou a votação e esteve presente nas sessões. Segundo ele, “os vereadores da bancada evangélica defendem sua religião e não o interesse da população”. Zaniolo completa: “Está é uma festa tradicional e não uma orgia coletiva, como um dos vereadores citou”.
Depois de muita discussão em torno da proposta, a Câmara acabou por aprovar o repasse à Liga. Assim como ocorre todos os anos, a Fundação Municipal de Cultura possui uma parceria com a Liga Carnavalesca. Segundo o diretor do Departamento de Cultura, Luis Cirillo Barbisan, a Liga faz um orçamento do que seria necessário para as escolas e, após, a Fundação entra em contato com a Prefeitura para negociação.
O carnavalesco da Águia de Ouro, Anderson Pedroso, trabalhou no carnaval de Ponta Grossa desde o início e acredita que ainda há muito para melhorar, principalmente no investimento feito pela prefeitura. “Todos os anos são disponibilizados 60 mil reais para a Liga Carnavalesca. Depois é a entidade que repassa a verba e divide igualmente entre as escolas”, explica. Cada escola em atividade recebe R$15 mil, já que um quarto do valor permanece com a Liga para investimentos gerais.
Participante ativo do carnaval há anos e atual membro da Águia de Ouro, Jorge Lopes afirma que a festa tem problemas financeiros desde 2003. “Naquela época, a prefeitura dava de R$ 3 mil a R$ 3,5 mil pra fazer um desfile”, conta Lopes.
Cirillo concorda que uma verba maior seria mais pertinente às escolas de samba. “Sempre esteve em discussão a questão do aumento da verba. O desfile de carnaval é o evento de maior público local. O que interessa é ver um belo espetáculo e para isso acontecer temos que oferecer condições técnicas favoráveis”, completa.
Membro da Águia de Ouro, Elicene Stolle acredita que a falta de recursos prejudica muito a produção das escolas, principalmente quando ocorre o atraso do repasse do governo local. Ela afirma que, por causa do atraso, a compra de materiais especializados é feita apenas pelas escolas com grande capital, que é o caso das cariocas e paulistas. “Acabamos tendo que improvisar e procurar por materiais mais baratos”, explica Elicene.
Desfile de superação
A falta de recursos para a elaboração do carnaval de rua deixa as escolas de samba sujeitas, muitas vezes, a um pequeno público e baixa aceitação da população. Porém, ainda com todos os problemas de estrutura enfrentados pelas escolas de samba, os membros acreditam que existe uma boa aceitação da população. “É muito gratificante desfilar e ver o público prestigiando. Tem gente que não se importa com sol ou chuva e está lá todos os anos”, afirma Delvana Bueno.
O Rei Momo André Zaniolo percebe que não há mais tanta distinção de classes como existia no passado. “No carnaval de 2015 estiveram presentes aproximadamente 30 mil pessoas. Eram mulheres, homens, crianças e idosos, pessoas de todos os tipos”, afirma Zaniolo.
Maria Rossler mora em Ponta Grossa há quinze anos e acredita que, mesmo melhorando a cada ano, quando comparado ao evento de outras cidades, a estrutura é menor e mais precária. Para ela, muitos dos problemas do carnaval estão ligados à própria cultura da população. “Acho que falta incentivo do governo. Um exemplo é o caso do Natal Iluminado, que foi muito bem aceito pelo público. A população prestigia o evento quando é bem elaborado e produzido”.
O diretor do Departamento de Cultura da Fundação Municipal de Cultura, Luis Cirillo, afirma que a instituição tenta auxiliar no que pode. “Atualmente estamos fazendo melhorias e colocando grades de contenção na avenida. Além disso melhoramos muito na questão do som e fizemos algumas oficinas com os membros das escolas para que fossem produzidos sambas com mais qualidade”, afirma
Nascida em Ponta Grossa, Larissa Santos acompanha o carnaval de rua há mais de 20 anos e dá total crédito às escolas de samba. “A cada ano as escolas se superam e trabalham mais duro para levar algo de qualidade até a avenida”, diz Larissa. Para ela, é visível a alegria no olhar das pessoas que investem seu tempo e suor para fazerem os outros felizes, nem que seja durante dois dias do ano.
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