Por Nathália Oliveira
Entre família e amigos surgiu o primeiro grupo de percussão de Ponta Grossa, o UBAtuque. Em 2013, Ricardo Correa, junto com outros músicos percussionistas, decidiu unir o interesse e a diversão, e, a partir disso, expandir conhecimento sobre percussão. Num primeiro momento, o grupo se reunia na casa dos participantes. Nestes encontros, Correa passava um pouco da sua experiência na música para os colegas. “A gente se reunia na casa dos amigos para poder trabalhar aulas de percussão. Comecei a coordenar umas a pedido do grupo. As reuniões aconteciam a cada 15 dias, porque na época eu morava em São Paulo”, afirma o músico, que fazia parte da banda Mandau.
Depois de algum tempo, essas pessoas decidiram firmar o grupo e nomeá-lo de UBAtuque, em homenagem a Ubaldo Pereira Júnior, um dos primeiros e mais renomado percussionista de Ponta Grossa. “Começamos a fazer reuniões com mais frequência e aí sim que demos um embasamento ao grupo, com mais participantes”, explica Correa.
O grupo UBAtuque se concretizou, principalmente, por causa da falta de visibilidade dada a trabalhos de percussão. “O Paraná não é muito ligado a esse lado da percussão, como é a região do Nordeste”, afirma Ricardo, que garante ter observado uma maior apreciação do trabalho, durante os dois anos do projeto, por parte da população paranaense. Assessora jurídica da Defensoria Pública de Ponta Grossa e cantora do Ubatuque nas horas vagas, Fernanda Correa acredita na importância de popularizar ritmos marginalizados, como afoxé (manifestação do ritmo africano). “Nosso objetivo é sempre crescer e atingir mais pessoas, tornar o grupo mais conhecido. O objetivo principal é levar a cultura”, diz Fernanda.
Aproximadamente 30 pessoas participam do UBAtuque, mesmo que muitas vezes alguns não possam comparecer aos eventos. Os ensaios, atualmente, são quinzenais, no Espaço Arte da Estação Saudade, no centro da cidade. Nos encontros, que ocorrem no domingo das 17h às 19h, é passado o repertório já tocado e também se inicia o trabalho com novas músicas. A percussionista do grupo desde o início, Nana Holz, conta que são construídos novos ritmos, intervalos e viradas de forma coletiva. “O mestre Ricardo passa para nós mais algumas noções dos instrumentos, conversamos bastante e damos muita risada. É renovador”, afirma a artista.
Universidade da música
Há 27 anos, Ricardo Correa descobriu a sua paixão pela música. Por influência dos pais, ambos músicos, o atual mestre do UBAtuque começou a acompanhar a música desde muito cedo. Foi com 12 anos que o seu interesse cresceu e entrou para a Banda Lyra dos Campos. Com a mesma idade já tocava em alguns bares e em eventos de Ponta Grossa.
– Comecei a tocar instrumentos de percussão, como pandeiro, surdo, tamborim e reco-reco, com o grupo Revelação do Samba. – conta Correa.
Jovem dedicado à música, Ricardo diz que já revezava os horários para tocar. Há noite realizava trabalhos em restaurantes e bares, onde conseguia arrecadar algum dinheiro. Enquanto isso, de dia combinava os estudos escolares com a Banda Lyra dos Campos.
– Com quinze anos entrei na banda Venda Proibida, que hoje em dia é a banda New York. Foi lá que comecei a tocar bateria. – diz Ricardo, que ainda hoje trabalha como baterista profissional.
A experiência que Ricardo adquiriu foi garantida por meio das bandas de que fez parte. O aprendizado, que começou na Banda Lyra dos Campos, pôde ser complementado por muitos outros grupos pelos quais passou durante seus 39 anos.
Iniciar a carreira de músico, no entanto, não foi fácil. Como se interessou muito cedo e decidiu seguir carreira profissionalmente, Correa teve que enfrentar a preocupação dos pais, muitas vezes. Estes queriam que o filho se garantisse em alguma profissão mais “segura”, mas o músico persistiu e hoje se diz realizado com o trabalho que escolheu.
Se não fosse músico, o mestre do Ubatuque admite que teria feito um curso de Educação Física, já que gosta muito de esportes. Não é raro perceber o quanto Ricardo é conectado ao corpo. Seja no movimento dos braços, tão utilizado na profissão de baterista, ou nas próprias escolhas de vida, ele sempre busca estar em equilíbrio com seu corpo.
– Nos últimos tempos fiz um curso de ioga e me tornei instrutor. Acho importante trabalhar a parte corporal e dar um pouco mais de vida musical. – afirma Ricardo.
O músico diz ter buscado na ioga o auto-conhecimento. É uma forma, segundo ele, de entrar em contato com o próprio corpo. Além disso, Ricardo também pratica uma série de atividades e tem uma rotina que o conecta com a música e melhora suas habilidades. Ele é praticante do Budismo e relata ter aprendido muito com a religião:
– Acho bacana trabalhar a parte espiritual. Isso influencia na música, na calma, na paciência e em enfrentar o público – observa Correa.
É perceptível na voz do músico o quanto sua carreira é importante. Ele faz questão de lembrar tudo que o trabalho com música já lhe proporcionou. Ele se diz um homem de sorte, já que muitos outros que tentam essa vida acabam interrompendo quando percebem que não será fácil.
Ao som do tambor, à voz da cultura
Uma característica muito presente no UBAtuque é o espaço e importância dada à família. O clã Corrêa é representado em massa no grupo ao subirem juntos aos palcos nas apresentações, sob o comando de Ricardo (filho), voz de Neuci e Fernanda (mãe e filha, respectivamente) e com o pai em um dos tambores.
A história do UBAtuque começou muito antes do surgimento em 2013. Se não fosse a influência dos pais, Ricardo jamais teria se tornado músico e criado o grupo junto com os amigos. Professora e cantora do projeto, Neuci de Almeida Corrêa conta que conheceu o marido através da música. “Eu estudava em um colégio em Jaguariaíva, onde havia um grupo de música do qual meu marido fazia parte e tocava contrabaixo. Nos conhecemos quando entrei nesse conjunto”, lembra Neuci.
A ideia de reunir aqueles que gostam de música surgiu de Ricardo, mas toda a família entrou na “brincadeira” e acabou dando mais alegria ao grupo. A dinâmica do UBAtuque é eletrizante e contagiante àqueles que assistem. A estudante Anne Andrade já pôde assistir a algumas apresentações e diz ter ficado impressionada. “Ao falarem que era um grupo de percussão não dei tanta atenção. Quando começaram a tocar foi uma felicidade só. O barulho das batucadas transforma o ambiente e o deixa mais alegre”, declara Anne.
Por ser um grupo formado, em sua maioria, por amigos, não é difícil o convívio e conversa entre os membros. Segundo Neuci, isso foi essencial para a formação do grupo. “Todo mundo se dá muito bem. O ambiente dentro do grupo é muito bom e isso ajuda bastante, já que todo mundo participa com vontade do UBAtuque”, diz a professora.
Professora da rede estadual e responsável por dar ritmo ao instrumento surdo, Nana Holz, que está no grupo desde o início, avaliou os encontros do grupo: “seja para ensaios ou apresentações, as reuniões são muito harmoniosas. Cada um procura respeitar o espaço do outro, ajudar; é uma cultura do bem. A sensação que tenho é que depois do encontro quinzenal do grupo, fico na expectativa do próximo, de tão bem que isto me faz”.
Entre os quase 30 membros, a maioria é composta por mulheres, isso chama atenção do público e dos próprios membros. Fernanda Correa afirma perceber uma maior procura e interesse das mulheres. “Assim como em todas as áreas de atuação, as mulheres estão buscando aprender mais. É bacana porque elas assumem o controle, a partir de qualquer instrumento, sem diferenças”, observa a cantora.
Seja com o público que for, durante tantas apresentações que já foram realizadas de 2013 pra cá, fica a satisfação dos membros em conseguir popularizar cada vez mais seu trabalho. “Aos poucos vai entrando na mente da pessoa essa questão cultural da percussão e dos afrodescendentes e indígenas que trouxeram essa cultura pra nós”, finaliza Ricardo.
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