O projeto “Mulher, Consciência e Ação” promoveu palestras sobre a violência contra a mulher entre os dias 7 a 11 de junho. O evento foi exibido no formato de lives pelo Facebook Dia de Arte, perfil do grupo de Teatro composto por David Dias, Jonas Boita e Michella França.
O projeto consiste na apresentação da peça “O Que Eu Deveria Ser Se Não Fosse Quem Eu Sou”, da atriz Michella França, e das palestras da assistente social no Tribunal de Justiça do Paraná, Bruna Miranda, lotada no Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Bruna é mestra em Ciências Sociais Aplicadas pela UEPG e doutoranda pelo mesmo programa. O projeto foi realizado com o incentivo do Programa Municipal de Incentivo à Cultura (PROMIFIC), da Prefeitura de Ponta Grossa, da Fundação Municipal de Cultura e do Conselho de Política Cultural.
No primeiro dia de evento, a live transmitiu o debate “relacionamentos abusivos e o ciclo da violência contra as mulheres”. A assistente social explica que a interação com o público, mesmo no formato online, é importante no contexto de pandemia para levar informações ao público, tendo em vista que a violência contra a mulher, especialmente no contexto doméstico e familiar, está mais frequente e mais grave.
A segunda palestra do projeto aborda os “fatores determinantes e implicações da violência contra as mulheres”. Bruna Miranda fala sobre a dificuldade das mulheres de se reconhecerem como vítimas ao se encontrarem em uma relação abusiva: “existem inúmeros fatores que dificultam essa percepção das mulheres. Questões sociais, culturais, os valores e papéis sociais impostos às mulheres e aos homens”. Além disso, ela explica que crianças e adolescentes são, muitas vezes, vítimas indiretas ou diretas da violência contra a mulher.
“Contextos e tipos de violência contra as mulheres” foi o tema da palestra do terceiro dia de evento. Antes de iniciar sua fala, Miranda comenta sobre a importância de peças como a da Michella França, que explanam um problema social e trazem conhecimento para o público geral. A pesquisadora utiliza o trecho apresentado da peça para relembrar o ciclo da violência e todas as suas etapas. Ela afirma que existem diversas situações no monólogo que ilustram os relacionamentos abusivos e reforçam este ciclo. Não há um número certo de vezes que o ciclo pode se repetir, mas ao fim de um ciclo, sempre há a falsa impressão de que o problema chegou ao fim.
Muitas mulheres ainda se deparam com alguns obstáculos para formalizar a denúncia e encaminhar este problema a um fim. Com a cultura da violência na sociedade, situações preconceituosas são propícias a acontecer com a vítima que pretende denunciar. Grande parte deste receio presente em denunciar o autor da violência vem do papel social imposto à mulher, se tornando mais um empecilho para a vítima. Mesmo hoje, com informação mais acessível a todos, a quebra do padrão social por algum indivíduo é condenada. Lentamente, essas questões estão sendo reprimidas por meio de diálogos, e este é um dos motivos pelos quais eventos como o Projeto Mulher: Consciência e Ação é tão importante.
Já no dia 10, quarto dia de evento, a palestra ministrada pela pesquisadora foi intitulada “Da culpabilização à resiliência: o rompimento do ciclo da violência”. Miranda começa enfatizando a rede informal de apoio à vítima, composta pelos familiares e amigos próximos. Assim como nos outros dias, a palestrante exemplifica sua fala com trechos da peça de Michella citando a culpabilização da mulher sofrida pela personagem. Ela expõe que muitas vezes a vítima busca apoio primeiramente na rede informal antes de formalizar sua denúncia, mas muitas pessoas ainda estão inseridas na cultura do machismo e não conseguem oferecer o apoio necessário.
Miranda explica a importância de que todos entendam o ciclo da violência e reconheçam um relacionamento abusivo para que possam ajudar as vítimas. Para finalizar a palestra, a pesquisadora apresenta um mapeamento de casos de violência contra mulheres em Ponta Grossa. É evidente que a pandemia interferiu nos pedidos de ajuda, já que a partir dos meses de março e abril de 2020 vê-se uma maior dificuldade de acessar as redes formais e informais de auxílio.
O evento foi encerrado com a palestra “Redes de apoio e de enfrentamento à violência contra as mulheres”. A palestrante traz informações sobre as redes e leis existentes para as mulheres em situação de violência, assim como as diferenças entre as redes de enfrentamento e de atendimento. A atriz Michella fala que o projeto vai além do evento da semana do dia 7, e que a equipe vai dar continuidade a ele em vista da relevância que possui. Ela também diz estar feliz por sua peça, e o projeto, atingirem e ajudarem um grande número de pessoas, lembrando que as palestras ficam salvas para serem acessadas a qualquer momento.
Sobre a peça
A peça intitulada “O Que Eu Deveria Ser Se Não Fosse Quem Eu Sou” foi construída a partir de um compilado de relatos reais ouvidos pela atriz Michella França. Dividida em cinco partes, trechos do monólogo foram apresentados pelo @cultura.pg no Instagram durante todos os dias do evento, dando início às palestras. “O Que Eu Deveria Ser Se Não Fosse Quem Eu Sou” conta a história de uma mulher e seu primeiro amor.
No início, tudo parecia um conto de fadas, mas o final foi bastante diferente. França utiliza-se apenas de uma corda para representar os sentimentos de uma vítima de violência de vários tipos. Ao decorrer da vida da personagem, ela se depara com muitas situações de agressão física e moral, mas acaba perdoando por influência de sua própria culpabilização e falta de apoio. Após anos de sofrimento, a personagem visualiza uma saída a partir da ajuda de uma vizinha e, por fim, se livra da relação de uma vez por todas.
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