Cinco décadas de um ‘vozeirão’ inesquecível

Houve um tempo em que os radialistas não eram simplesmente profissionais da comunicação. O público os encarava como verdadeiros astros. Suas vozes marcantes encantavam não só pelo timbre, mas pela simpatia e carisma que expressavam aos ouvintes. Essa é umas das características que resumem a era de ouro do rádio no Brasil, tempo em que o veículo de comunicação tinha toda a magia de um meio ágil e ao mesmo tempo fascinante.

O radialista ponta-grossense Ney Costa é um exemplo vivo dessa época em que somente quem tinha voz diferenciada poderia falar aos microfones. Um personagem tranquilo, que se veste de maneira simples. Cidadão antenado, lê as notícias do dia e comenta com seus ouvintes. Quem o vê pelas esquinas da Rua XV, onde fica seu local de trabalho, jamais pode imaginar a riqueza de histórias que ele tem pra contar.

Nascido em 3 de Abril de 1945 é um profissional respeitado no meio jornalístico. Iniciou sua carreira com apenas 16 anos na rádio clube de Ponta Grossa, a mais antiga do Paraná. “Eu sempre quis trabalhar em rádio, minha mãe ouvia a Rádio Nacional do Rio. As emissoras tinham ondas curtas e tinham novelas. Com dez anos eu pulei numa caminhonete de som e falei para o motorista que queria ser radialista, a partir daí nunca mais parei”.

Uma das características de Ney Costa, assim como de outros radialistas da época era a relação com ouvinte. Suas palavras expressam alegria, emoção e entusiasmo, sobretudo nos programas de entretenimento. A partir de 1975 ingressou na Rádio Bandeirantes de São Paulo e foi com o programa ‘As mais mais’ que Ney Costa consagrou-se no meio radiofônico. “Na Bandeirantes eu apresentava ‘As mais mais’, que era música e comentário, com as paradas de sucesso da época. Fiquei lá até 1991 quando voltei para Ponta Grossa e continuo com o programa até hoje”.

Nesses anos que considera como o auge da sua carreira, conheceu artistas famosos do meio cultural brasileiro e teve contato com grandes nomes da nossa música. “Eu lancei muitos famosos. Alcione, Luís Airão e Belchior. Também fui jurado no programa do Chacrinha, fui amigo dele e do Bolinha. Os anos 1970 e 80 foram áureos”.

Além do entretenimento, Ney Costa deixou seu legado na área do jornalismo esportivo. Ele cobriu quatro Copas do Mundo (1974, 1978, 1982 e 1986) e participou de uma excursão pela Europa com o Coritiba Football Club. “Fui o primeiro locutor do Paraná a viajar pela continente europeu cobrindo esporte. Foi em 1969, quando acompanhei o time do Coritiba por 18 países da Europa. Depois fui para a Rádio Tupi do Rio de Janeiro, onde narrava desfiles de carnaval e em seguida para a Rádio Sociedade da Bahia em 1972, já cobrindo Copas do Mundo”.

Em uma dessas coberturas, Ney relembra um fato curioso que ocorreu enquanto narrava um jogo em Sophia, na Bulgária. “Eu fiz uma transmissão onde que eu não sabia se a fala tinha chegado – ‘Alô Brasil. Boa tarde senhoras e senhores. Estamos falando do estádio Almenzá na Bulgária. Obrigado pela audiência’ –, eu irradiava sem saber se as ondas tinham chegado e ficava na expectativa”.

Em 1996 voltou para a Rádio Clube onde trabalha até hoje. Um local modesto em comparação às outras empresas onde trabalhou. Durante 50 anos de rádio, Ney Costa acompanhou diversas fases de transformação na comunicação, sobretudo a evolução tecnológica dos veículos informativos. Um avanço que segundo ele, facilita muito o trabalha dos jornalistas. “A evolução tecnológica foi maravilhosa. Nós trabalhávamos com gravadores antigos e microfones que pareciam verdadeiras latas velhas. Nos anos 60 não era locutor quem não tivesse uma boa voz. Mas hoje é tão fácil, tão moderno. Principalmente quando a Embratel nasceu para suprir a necessidade de comunicações internacionais eu peguei esse momento de avanços”.

Com o advento da tecnologia a produção, edição e transmissão do conteúdo radiofônico ficaram mais rápidas e eficientes. Porém, para Ney Costa essa transformação fez com que o rádio perdesse um pouco do prestígio que tinha em épocas anteriores. Isso se deve principalmente a proliferação de outros veículos comunicativos. Mas para o veterano radialista, o rádio jamais poderá ser substituído.

“A tecnologia trouxe uma nova dimensão, as pessoas vivem uma outra era. Não estamos mais naquele tempo em que o rádio consagrava grandes locutores. Eles eram considerados deuses perante o público que os ouvia. Os homens e mulheres que tem hoje entre 60 e 70 anos achavam aquilo uma coisa maravilhosa. Os locutores das radionovelas eram como o galã e a mocinha das telenovelas de hoje. A voz era uma coisa fantástica que encantava a todos”.

Com uma poesia interpretada no improviso sobre a história do rádio, Ney Costa despede-se e finaliza a entrevista com uma frase marcante: “O rádio nunca será alcançado pela televisão, pois só ele mantém o imediatismo associado à capacidade de imaginação do público”.

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