Entre as mudanças da sua vida pessoal e de Ponta Grossa, o senhor coleciona memórias de onde trabalhou, criou seus filhos e vive até hoje
Valdomiro de Oliveira nasceu em 1928 em Teixeira Soares, é pai de quatro filhos, avô de dez netos, bisavô de dez bisnetos, viúvo e morador de Olarias há mais de 60 anos. O idoso veio para Ponta Grossa no dia 1 de maio de 1952 para tentar a vida após se casar com Alice Gonçalves de Oliveira no dia 19 de junho. “Eu queria me casar, no sítio não tinha condições, não tinha serviço. A vida era dura lá”. Veio para Ponta Grossa e trabalhou na Marmoraria Vassorim, em frente ao Cemitério Central. Nesta marmoraria fizeram todos os ladrilhos da Igrejinha de Uvaranas, que estão lá até hoje.
Quando se mudou para Ponta Grossa, alugou uma casa em Uvaranas. Depois foi morar em Olarias, onde vive há mais de 60 anos em uma casa de madeira amarela, cor preferida de sua viúva, cheia de cortinas e fotos da família, chão com carpete e algumas imagens religiosas.
CAMINHADA
Valdomiro veio para a cidade com o intuito de trabalhar com algo que sempre amou: trens. Todas as vezes que cita os trens e sua trajetória na empresa não consegue deixar de expressar como gostava do trabalho que fazia. “Eu entrei na Rede Ferroviária no dia 2 de dezembro do mesmo ano [1952], meu primo entrou no emprego e após quatro dias foi mandado embora, eu soube da vaga, me candidatei e entrei no lugar dele”. O senhor trabalhou por três anos na estação de Uvaranas em Ponta Grossa, foi transferido para a estação de Valinhos e trabalhou lá por dois anos e meio. Depois disso, foi transferido para a Estação de Oficinas, novamente em Ponta Grossa.
Cansado de trabalhar debaixo dos vagões fazendo consertos, fez requerimento e começou a trabalhar dentro do escritório. Por saber ler e escrever foi aceito e trabalhou durante 13 anos com a chefia no almoxarifado. O idoso conta que recebia trem todas as horas do dia, e que era muito puxado dar conta de tudo.
Com um salário mais alto, comprou o terreno da casa onde vive até hoje, em Olarias. A casa foi construída tijolo por tijolo pelo senhor e sua esposa. Mas o dinheiro sempre foi problema: “nesse meio tempo já tinha dois filhos e minha esposa estava grávida do terceiro, o dinheiro estava curto, por conta da construção da casa, e eu tive que procurar um emprego para complementar a renda”, relata. Valdomiro lembra que a jornada de trabalho na rede era de 24 horas seguidas, então no dia de descanso ele trabalhava como cobrador para fotógrafos da cidade. “Dormia até meio dia, almoçava e saía com uma pasta debaixo do braço para cobrar as pessoas. Naquela época as fotos eram parceladas pois o preço era muito alto, então eu saía fazer as cobranças das parcelas”.
O senhor também trabalhou puxando areia e ajudando na construção da Igreja dos Mórmons no Centro afirmando que “dinheiro sempre é bem-vindo quando se tem quatro filhos para criar”. Alice, esposa de Valdomiro, fez curso de corte e costura e, segundo ele, era muito boa no que fazia e se tornou uma referência no bairro. Mas o dinheiro que ganhava não era suficiente para ajudar nas contas da casa.
PERSPECTIVAS
O senhor analisa e lembra com muito carinho tudo que viveu e todas as mudanças que presenciou, principalmente no seu bairro, nestes últimos 67 anos. “Agora está muito diferente do que era antes, eu vi muita coisa mudar, a cidade crescer em lugares que antes era só mato. A população da cidade aumentou muito, o número de prédios, de comércio, de ônibus e linha de ônibus, de carros”. Valdomiro dá ênfase quando comenta sobre o saneamento de Ponta Grossa: “hoje tem saneamento, água encanada, quando eu vim morar aqui eu tive que fazer um poço artesiano com 16 metros de fundura, ele ainda existe, mas está lacrado, com o tanto de chuva dos últimos dias com certeza ele está cheio”.
Outro aspecto que o idoso aponta é a mudança na própria vegetação da região. “Eu lembro de uma vez que um vagão de um trem da rede tombou próximo aqui de casa. Era um vagão com sementes e alguns resquícios de vegetação vindo do Rio Grande do Sul, isso se espalhou por aqui e o mato começou a crescer diferente, além dos vários tipos de plantas e árvores que começaram a crescer um tempo depois”. A região da casa de Valdomiro, próxima à garagem da Viação Campos Gerais, realmente conta com árvores que são típicas da região dos pampas gaúchos.
MUDANÇAS
O senhor se aposentou em 1983, nesse ponto da vida seus filhos já não moravam mais com ele e sua esposa. Nesta época, investiu nas cadernetas de poupança e fez muito dinheiro. “Comprei um carro e aprendi a dirigir sozinho, comecei a viajar com a minha esposa, fomos até para a Bolívia, conhecemos várias cidades do Brasil e até mesmo alguns países da América Latina”. A esposa de Valdomiro faleceu há dois anos, ele relata que foram tempos difíceis, pois Alice passou por três tipos de cânceres e dez cirurgias em um único joelho.
Valdomiro ainda mantém a casa como Alice deixou, com uma estante que abriga fotos de todos os filhos, netos e bisnetos, festas da família e convites de formatura dos netos nas paredes. Alice colecionava imãs de geladeira, todos estão na mesma ordem até hoje e mostram as várias viagens que o casal fez pela América Latina. O brilho nos olhos ao falar da viúva é difícil de não se notar. Ele conta que Alice sempre amou dançar. “Ver minha esposa com tantas doenças que não deixavam ela dançar era o que me deixava mais triste, sempre estive do lado dela e sinto muita falta da companhia dela”.
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