A popularidade de “Não Olhe Para Cima”, filme dirigido por Adam McKay, veio antes mesmo do filme entrar na plataforma da Netflix. Desde a divulgação do elenco, composto por grandes nomes da indústria cinematográfica, as expectativas do público eram motivadas pela curiosidade. Uma comédia-catástrofe protagonizada por Meryl Streep, Leonardo DiCaprio e Jennifer Lawrence não é exatamente o contexto mais fácil de se imaginar, mas as indicações ao Oscar de Melhor Filme e Melhor Roteiro Original são alguns dos pontos que comprovam o acerto de McKay ao harmonizar os talentos do seu elenco em um longa com uma mensagem inteligente.
Apesar de o roteiro ter sido escrito antes mesmo da pandemia da Covid-19, é impossível não fazer analogias com o contexto do mundo real. A premissa da história parte da descoberta de um meteoro com potencial para dizimar a vida no planeta, e mesmo após tentativas de alertar a sociedade sobre os riscos do negacionismo científico, a dupla de cientistas Randall (Leonardo DiCaprio) e Kate (Jennifer Lawrence) se frustram ao perceber que a humanidade foi convencida a acreditar que a possibilidade de mineração do corpo celeste após o seu contato com a Terra é mais importante do que a preservação da vida humana. Não demorou muito para que o público conectasse os pontos da narrativa fictícia para a realidade da vida em meio a uma pandemia, em que “explicar o óbvio” sobre o conceito de humanidade e cuidado pelo próximo se tornou mais comum do que parecia ser necessário.
Grande parte do filme é localizado nas ruas aceleradas das cidades americanas, onde a presidenta dos Estados Unidos, interpretada por Meryl Streep, flerta os seus interesses de poderio econômico com grandes empresários, sendo um deles Peter (Mark Rylance), diretor da BASH, empresa que promete revolucionar a sociedade através de tecnologias de inteligência artificial que desumanizam os usuários das ferramentas em favor da produtividade. McKay é extremamente delicado ao utilizar desta ansiedade do cenário do longa para transitar entre as cenas com gravações simples e desaceleradas de crianças, animais e fenômenos da natureza, um ato sutil que reforça a fragilidade da vida contemporânea em que o ser humano deixa de perceber as belezas genuínas do dia a dia.
Outro ponto crucial para entender o humor ácido de “Não Olhe Para Cima” é a representação da cobertura jornalística e midiática diante de situações de tragédia. No filme, os cientistas são minimizados por jornalistas cujo repertório de conhecimento sobre ciência não passa da pergunta “os alienígenas existem mesmo?”. Os reflexos do jornalismo precário do longa são tão brutais quanto na vida real: memes, vídeos e hashtags menosprezando a notícia viralizam mais do que a própria informação, fazendo com que os cientistas se sintam fragilizados. Como último artifício relacionado à modernidade que cativa o público jovem entusiasmado pelo filme, os artistas Kid Cudi e Ariana Grande atuam como DJ Chello e Riley Bina, casal de cantores que evoluem de celebridades avulsas aos problemas da sociedade para influenciadores ativistas nas redes sociais, finalizando o seu arco com a performance de “Just Look Up” (Apenas Olhe Para Cima), canção original do filme que tem em sua letra a motivação de olhar para o problema, que neste caso, é o meteoro caindo do céu.
Exceto pela facilidade ao notar o sarcasmo em estereótipos de contexto sociopolítico nos personagens, como o jovem anarquista Yule (Timothée Chalamet) e o ex-militar conservador Benedict (Ron Perlman), o filme pode ser um pouco cansativo para quem não está acostumado a assistir obras audiovisuais do gênero comédia, principalmente pela duração do filme, contabilizando em mais de duas horas. O seu epílogo, de 15 minutos, é o momento mais fraco de toda a sua extensão, pois finaliza a história com um ar de “continua…”, o que seria dispensável pelo desfecho original. Por outro lado, as performances estelares, roteiro bem desenvolvido e excelente produção de efeitos visuais certificam o ritmo divertido de um filme que leva discussões importantes às grandes plataformas, reafirmando a popularidade de “Não Olhe Para Cima” entre o público por um bom tempo.
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