Atitude na hora de gravar

Serviço: Programa HipHop PG
Todos os sábados 18 horas
TV Educativa (Canal 58 UHF e 7 na TV à Cabo)
Reprises no site http://hiphoppg.com.br

Holofotes, pessoas no estúdio, muito cuidado com maquiagem. Lá vem a claquete e… Luz, Câmera, Ação.

Este é pensamento de muitas pessoas quando imaginam como é a gravação de um programa de TV. Porém, a realidade é muito diferente quando falamos de produtores independentes. Um exemplo destes é o da dupla MC Gueg e MC Pá, que sozinhos tocam o programa de TV Hip Hop PG. O programa é apresentado todos os sábados na TV Educativa de Ponta Grossa. Por sinal, a produção do Hip Hop PG nem passa perto do prédio da tradicional emissora pública.

É quarta-feira, 14 horas. MC Gueg vai aproveitar o dia de folga para gravar o programa da semana. Além de ser cantor, apresentador de TV e produtor musical, ele dirige uma empilhadeira em uma fábrica de Ponta Grossa por cinco dias da semana.

Eu havia conversado ao telefone com ele para verificar a possibilidade de acompanhar a gravação do programa. Como jornalista, imaginei que a coisa poderia ser profissional. Com pauta, fontes, espelho, script e todas outras “bobageiras” que jornalistas insistem em ter para um programa. Também imaginei que iria a algum estúdio da TV Educativa. Afinal, Gueg havia pagado uma quantia razoável para manter o programa na TV aberta da cidade. Sonho realizado graças a um edital do governo federal.

Quando soube que a gravação não seria na TV e sim na casa dele (no bairro da Ronda), comecei a desconfiar que as gravações do programa não eram tão organizadas assim. E lá estou eu, junto a duas colegas da universidade rumo ao local onde é produzido o Hip Hop PG. A missão era encontrar uma casa verde de esquina na Rua Chile. O detalhe é que no local quase todas as casas de esquina eram verdes. Este fato tornava o estúdio que eu imaginava cada vez mais normal.

Quase no fim da rua, enxergo Gueg à frente da casa. O nosso astro de TV estava vestido da forma mais comum possível. Camiseta, suor no rosto por causa dos mais de 30 graus que fazia no dia e bermuda.

– Ohh. Pensei que você não viria. Peraí que preciso ir tomar um banho.

Ficamos na varanda da casa. Além das características descritas no telefone, a casa era de madeira e além de Gueg e Pá, um simpático cachorro vira-lata ficava no pátio. Uma casa comum em um bairro comum de Ponta Grossa. Quem passasse à frente jamais imaginaria que lá era feito um programa de TV.

Enquanto Gueg tomava a “chuveirada”, o convidado do programa Hip Hop PG havia chegado. Era o B-Boy Andrey. A ideia do dia é gravar uma apresentação dele e do grupo de amigos que dançam Brake. Porém, nenhum dos amigos ainda havia chegado para gravar. Começo a conversar com o garoto, que aparenta não ter mais de 18 anos, sobre o programa de TV.

– Eu sempre participo do Hip Hop PG. Depois que o programa foi ao ar, aumentou muito o número de pessoas que procuram aulas de Brake comigo.

– E o que vai rolar hoje?

– Tem que ver com o Gueg. Os rapazes não estão atendendo aos telefonemas. Mas se não der para gravar todo mundo, eu mesmo gravo. A gente vai lá ao local onde eu dou aula.

Neste meio tempo, Gueg volta do banho. Ele está devidamente vestido para o programa: usa uma camiseta GG escrita Hip Hop PG. Pá também utiliza uma camiseta assim. Ele finalmente nos convida a conhecer o estúdio. Trata-se de uma salinha de 3×3 metros. Há um “aquário” com isolamento térmico. No local de 1,5×1,2 metros são gravadas músicas dos grupos que se apresentam no programa. Um vidro divide o computador do local com isolamento de som. É neste PC que Gueg faz as edições do programa de TV. À frente do computador ele e Pá também gravam as chamadas para o Hip Hop PG.

O local é minúsculo, mas o equipamento é de primeira: o computador, o estúdio e a câmera que ele utiliza. Por um segundo, pensei em pedir emprestada a infraestrutura do Hip Hop PG para fazer as gravações de TV. Logo, o momento de inveja passou. Até por que havia uma entrevista para fazer.

Pergunto a Gueg o que vai ser gravado para o programa do fim de semana:

– Tenho umas imagens que gravei em um show de Hip Hop em Londrina. 3 mil pessoas. Cheguei só para gravar. Mas quando fui ver, já tava cantando com os caras no palco. Só preciso fazer umas chamadas daqui mesmo e depois vou botar o Andrey para fazer as chamadas da apresentação de dança. Depois a gente vai na Casa da Dança para gravar.

Enquanto ele falava, eu comemorava em silêncio. Cheguei a ter medo de não ter nada para fazer de cobertura sobre o programa de TV. A casa pequena, o local isolado, o momento que vi Gueg. Nada parecia me empolgar. Agora, percebi que iria acompanhar tudo “de camarote”.

Gueg deixa a câmera em cima da mesa. A altura do móvel é programada especialmente para as filmagens. Ele faz uma chamada rápida e de improviso, no melhor estilo Hip Hop. Logo chega a vez de Andrey. Gueg pensa em um texto para ele falar e o garoto repete. 1, 2, 3, 4, inúmeras tentativas depois… ele acerta a chamada. É, nem todo mundo tem o dom do improviso.

Pronto. Faltava a última parte da gravação. Como a casa não tinha espaço para Andrey mostrar a dança, o jeito era pegar o Santana velho que estava à frente da casa verde e sair para filmar.

Rumo à gravação externa

Fiquei no banco do carona. Quando entrei, bati a porta com o máximo de força possível. Infelizmente a porta não fechava. Então fui a segurando mesmo. Gueg parecia brigar com o carro ao dirigir. O calor e o tempo que o Santana ficou ao sol também não ajudavam. Enquanto derretíamos no carro, Gueg (perito em empilhadeiras) tenta justificar as barbeiragens.

– Este carro não é meu. É difícil sem direção hidráulica.

Não chego a perguntar qual era o carro dele e porque estava dirigindo aquele carro. Algum tempo depois, descemos do carro. Gueg fala para Andrey esperar. Ele quer gravar a chegada à Casa da Dança.

Enquanto Andrey caminha, Gueg corre por diversos ângulos para filmá-lo. Enquanto se abaixa e filma o tênis All-Star do rapaz, ele me conta as ideias para o programa:

– Vou montar tudo isso em uma cena e colocar uma música. Quem disse que não dá para fazer várias câmeras em uma só… hahaha.

Por fim, mais alguns passos de dança são gravados. O programa da semana está feito. Ou melhor, quase. Gueg ainda vai ter que editar o que filmou no dia. Antes de eu ir embora, ele pede para eu fazer uma chamada para o Cultura Plural. Não podia fazer feio na frente dele (que improvisou tão bem). Na pressão, me saio bem na câmera e me despeço.

Já voltando para casa, penso diversas coisas sobre a mídia. A mais importante delas é que não se precisa de muito dinheiro e infraestrutura para fazer um bom programa de TV. Muitas vezes, vontade, amor às atividades e um pouco de talento para improvisar ajudam a dar conta do recado. E nem importa se o estúdio está em uma casa verde numa esquina nos confins da periferia da cidade.

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