Em defesa da memória, UEPG também precisa de Comissão da Verdade

Qual o método mais simples para evitar que injustiças e abusos autoritários se repitam, seja em nível regional ou nacional? Em primeiro lugar, é conhecer e divulgar as mais diversas práticas de tortura, prisão e desrespeito aos direitos humanos.

Este é o objetivo da Comissão Estadual da Verdade, no Paraná, criada em novembro de 2012, com aprovação da Assembleia Legislativa, que visa “examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticados no Estado do Paraná no período de 18 de setembro de 1946 a 05 de outubro de 1988 e contribuir com a Comissão Nacional da Verdade na consecução de seus objetivos previstos no artigo 3o da Lei Federal no 12.528, de 18 de novembro de 2011”.

Pela legislação, “a participação na Comissão Estadual da Verdade no Estado do Paraná será considerada de serviço público relevante e honorífico pela concretização do Estado Democrático de Direitos e promoção dos Direitos Humanos”. E, neste sentido, é oportuno lembrar que “a Comissão Estadual da Verdade do Estado do Paraná atuará de forma articulada e integrada com os órgãos públicos, instituições e movimentos sociais”.

Agora, o que este debate tem a ver com a UEPG? É compromisso das universidades, em um momento que os principais setores envolvidos ou atingidos, direta ou indiretamente, por práticas de desrespeito aos DHs, levantar eventuais casos ou situações registradas durante o período indicado pela Comissão Nacional da Verdade.

Diversas universidades, em inúmeras cidades do País, com o intuito de contribuir para esta recuperação histórica da memória coletiva, já criaram suas instâncias ou grupos em níveis locais ou regionais de abrangência.

No Paraná, a UFPR já adiantou este debate, buscando fazer sua parte no levantamento de fatos que possam auxiliar o trabalho das comissões em andamento (nacional e estadual). A Unioeste, no Campus Cascavel, sediou uma importante audiência pública da Comissão PR, ouvindo testemunhas e parentes de vítimas do regime militar brasileiro instaurado pós-1964.

No mês de março/2014, a Comissão da Verdade e o ‘Comitê Memória, Verdade e Justiça do Oeste do Paraná’, em parceria com a Unioeste, possibilitaram a coleta de manifestações documentais de ex-militantes de movimentos contra a ditadura, amigos e familiares de vítimas de tortura, entre camponeses, sindicalistas, indígenas ou estudantes que, de alguma forma, foram atingidas pelas práticas autoritárias registradas no período. O auditório lotado da Unioeste, nas várias atividades realizadas, confirma que este debate não se trata de mera casualidade, mas de um desafio a ser assumido também pelas universidades. E, nos Campos Gerais do Paraná, inclusive pela história de existência oficial desde 1969, cabe à UEPG dar sua contribuição como instituição de ensino superior público.

Por se tratar de debate de reconhecido interesse público, é fundamental que mais diversos setores representativos da sociedade civil se manifestem para integrar este desafio de levantar situações, fatos ou documentos que podem mostrar os desdobramentos concretos dos regimes autoritários na região, em Ponta Grossa e também eventuais impactos na UEPG.

Sem isso, corre-se o sério risco de reproduzir uma máxima forjada pela desinformação de que, “no interior do Brasil”, não houve ditadura. É preciso, pois, conhecer e esclarecer tudo o que for possível, inclusive para poder falar e defender o respeito à democracia e a garantia plena aos direitos humanos. E, por consequência, construir um compromisso coletivo de que práticas ditatoriais não podem, jamais, ter espaço em uma sociedade forjada por hábitos democráticos e de respeito à cidadania.

Sérgio Luiz Gadini, jornalista, coordenador do Programa de Mestrado em Jornalismo da UEPG.
E-m: sergiogadini@yahoo.com.br

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