Fortalecimento da cultura local é prejudicado por falhas de gestão

Por Fernanda Penteado

Você já tentou acessar a agenda cultural no site da Fundação Municipal de Cultura (FMC)? É provável que, ao tentar acessá-la na página da FMC (www.culturapg.com.br) ou por meio da página da Prefeitura (http://www.pontagrossa.pr.gov.br), você não consiga ter acesso a uma lista ou calendário de eventos mensais, como é proposto pelas diretrizes culturais. A agenda foi, no ano de 2015, mal divulgada e, por vezes, só repassada aos meios de comunicação da cidade ao final do mês e, muitas vezes, com apenas uma semana na agenda de eventos. A página da FMC é, também, pouco funcional, com o espaço da agenda sem utilidade. Todos esses fatores contribuem, em certa medida, para o não fortalecimento da cultura local, que está diretamente ligado aos canais de comunicação.

Quando se fala de agenda cultural, as diretrizes culturais de 2015 – definidas na 16ª Conferência Municipal de Cultura – preveem a organização e divulgação da “agenda cultural anual, com atualização e publicação mensal” e, ainda, a criação e manutenção na internet de um “portal do órgão gestor municipal de cultura para divulgação da agenda cultural e outras informações relevantes da área”. Esses dois pontos apresentam falhas.

Segundo o diretor do Departamento de Cultura da FMC, Luis Cirillo Barbisan, a inacessibilidade na agenda cultural está vinculada a uma mudança no funcionamento da Fundação. “Nos últimos tempos nós tivemos uma descentralização de certas coisas, e aí foi tão descentralizado que ninguém conseguiu centralizar para poder informar”, relata o diretor.

Quando perguntado sobre o site e sua atualização, Barbisan admite que o site é pouco funcional, e que por diversas vezes isso atrapalhou parte de seu trabalho. “Para nós isso também é muito complicado, quando eu quero mostrar alguma coisa para alguém ou mandar um e-mail de algo do site, eu não acho. Nós temos essa dificuldade enorme”, expõe.

Na questão de divulgação de eventos e agenda, o assessor de imprensa da FMC, Eduardo Godoy, explica que, hoje, grande parte da divulgação é via facebook, e que lá ela se torna mais funcional.

Nesse aspecto, as Diretrizes Culturais preveem, também, novos meios de comunicação para fortalecer a cultura local, entre eles um aplicativo para celulares “com conteúdo sobre estabelecimentos voltados à arte e à cultura, atrativos turísticos, eventos e ações culturais”. Entretanto, o aplicativo ainda não existe e não deve sair das diretrizes tão cedo. “O aplicativo é inviável por conta de orçamento”, explica Godoy.

Outro problema de divulgação visto em 2015 foi o cancelamento e adiamento de eventos, muitos deles só informados quando o público já estava no local, como no 7º Festival de Música de Ponta Grossa, que ocorreu em outubro do ano passado. Barbisan estava em licença na época do festival, mas explica o que acontece na maioria dos cancelamentos: um entrave dos processos de contratação. “Tem acontecido esse descompasso com a parte de contratação e principalmente pagamentos, que ficam na Prefeitura e que, às vezes, nós somos obrigados a cancelar em cima da hora alguma coisa para não incorrer numa improbidade administrativa”, informa.

O Sexta às Seis também teve algumas apresentações canceladas em 2015, todas por conta do mau tempo (http://www.culturaplural.com.br/members/nicoly/sexta-as-seis-encerra-so-em-2016#.VntETvkrLIU). As duas apresentações pendentes da edição 2015 do projeto acontecem em 2016, ainda sem data marcada.

Editais não premiados

O ano de 2015 foi marcado, na área da cultura, pelo atraso no pagamento de premiações de editais do ano anterior (2014) e do ano em curso. Os editais funcionam como uma forma de divulgação da cultura local e também do trabalho de alguns grupos e agentes culturais de Ponta Grossa. Além desses, a premiação de um dos editais de 2013 ainda não aconteceu, como é o caso do ‘Totens Culturais 2013’. Este edital teve suas inscrições abertas em agosto daquele ano, no entanto o resultado só foi divulgado em fevereiro de 2014, e a premiação não aconteceu até o momento. Em março de 2014, foi aberto o edital ‘Totens Culturais 2014’, mas segundo a ata com o resultado, publicada no site da Fundação (http://culturapg.com.br/editais/?p=1), não houve inscritos.

A Prefeitura de Ponta Grossa, por meio da Fundação Municipal de Cultura e do Conselho Municipal de Cultura, instituiu o edital com o “o objetivo de incentivar as expressões culturais da Cidade”, de modo a atender às diretrizes aprovadas na Conferência Municipal de Cultura.

Como premiação, o edital previa a “exibição das poesias selecionadas nos totens de divulgação da Prefeitura Municipal por um período mínimo de 15 dias de acordo com a viabilidade de agendamento, custo e manutenção”, além de certificado e a disponibilização do trabalho – poesia escolhida – na internet para o acesso público. Os totens não foram realizados e o trabalho não foi encontrado no site da Fundação de Cultura e da Biblioteca Municipal.

Nicoly França, jornalista e uma das ganhadoras da edição 2013 do concurso de Totens Culturais, explica que não houve divulgação do resultado. “O prêmio não foi entregue, apesar de não ser em dinheiro, e a publicação não foi feita”. Ela conta que tentou entrar em contato com a FMC por e-mail algumas vezes, mas não obteve nenhuma resposta. Nicoly relata que soube do resultado por uma de suas professoras da universidade e por uma amiga, mas que ninguém da Fundação entrou em contato com ela.

O diretor do Departamento de Cultura da Fundação Municipal de Cultura, Luis Cirillo Barbisan, explica que esse edital, junto aos editais de literatura, de um modo geral, são um ‘caso sério’ no quesito premiação. Segundo ele, os problemas se dividem em dois, o pagamento do prêmio – do ano de 2014 nenhum foi pago – e a não publicação de livros de editais a partir de 2013, isso por conta de um entrave com a Secretaria de Finanças.

“Desde 2013 a Secretaria de Finanças tem desaprovado, mesmo com o edital publicado em Diário Oficial, as licitações para a contratação da gráfica para imprimir os livros. Inclusive, com esses livros, estão também a impressão dos banners que vão nos totens e ainda tem um outro, o da poesia no ônibus. Esses são os cartazes que são colados nos ônibus, que também são feitos por licitação. A licitação para esses três materiais desde 2013 vem sendo reprovada”, ressalta Cirillo Barbisan.

O diretor de Cultura aponta ainda para a importância da cobrança dos artistas e das pessoas que utilizam e usufruem desses projetos. Para ele, a importância se dá, também, no aspecto de poder mostrar a relevância desses pagamentos. Ainda não existe previsão para a premiação – exposição dos totens – do ‘Concurso Totens Culturais 2013’. Somente o edital de 2012 – primeira edição do concurso – dos totens culturais foi cumprido. Mais de 40 totens foram expostos em locais de grande circulação da cidade.

No dia 21 de dezembro de 2015, foi publicada no facebook a ‘Carta Aberta para a Fundação Municipal de Cultura’, assinada por participantes e vencedores dos editais culturais da Fundação Municipal de Cultura, que expunha uma série de críticas ao cenário de concursos culturais, principalmente quanto ao pagamento – atrasado – de sua premiação, tornando pública a situação. Segundo o documento, exige-se “da Fundação Municipal de Cultura o mínimo que se espera de um órgão do poder público: transparência, diálogo e lisura”.

Luiz Augusto Estacheski, vencedor do edital de Fotografia de Patrimônio Cultural e um dos idealizadores da carta, explica que a FMC justifica o atraso pelo corte de verbas por parte do Governo Federal. “Para mim soa um tanto quanto cínico porque, até onde eu sei, esse dinheiro é apenas da Prefeitura e já está previsto em cada orçamento”, opina Estacheski. Ele expõe ainda os problemas com a comunicação e a publicidade do processo. “Não houve transparência no processo. Talvez estivéssemos mais calmos se as coisas fossem melhor explicadas, mas não foi assim”.

Outra crítica feita na carta foi a respeito da desvalorização do artista local e do corte de verbas na área da cultura, sendo esse o primeiro a sentir os efeitos da crise. A carta completa pode ser encontrada aqui: (http://escritaforadesi.tumblr.com/post/135637721311/carta-aberta-para-a-funda%C3%A7%C3%A3o-municipal-de-cultura).

Em nota, publicada no dia 22 de dezembro – um dia após a veiculação da carta -, a Fundação Municipal de Cultura pede desculpas pelo atraso no pagamento e afirma que irá quitar os R$78 mil que deve entre concursos de literatura, de fotografias, de audiovisual, de ilustrações, de artes visuais, de práticas pedagógicas e contação de histórias, além do Sexta às Seis. A justificativa para o atraso está na crise: “o governo municipal vem sofrendo com atrasos em repasses de recursos do governo federal para a atenção básica, o que acaba dificultando a manutenção das contas municipais”, explica a nota.

Divulgação independente no movimento hip-hop

Alguns grupos culturais da cidade, a exemplo do movimento hip-hop, realizam sua divulgação de eventos e agenda de modo independente, não passando, muitas vezes, pela agenda da Fundação Municipal de Cultura. Em Ponta Grossa há aproximadamente 20 anos, o hip-hop ganhou espaço nos últimos 10, e os eventos realizados pelo movimento abrangem além da música – rap e DJ’s – outras duas áreas do hip-hop: a dança com o breakdance, e o graffiti.

Segundo Ismael Gueg, um dos representantes do movimento hip-hop e produtor de rap, os canais de comunicação, como o facebook, tem grande importância no fortalecimento da cultura, na divulgação do trabalho de um grupo cultural e, também, de seus eventos. “Nossa divulgação está sendo independente, e é feita pelas redes sociais mesmo. Todos os nossos eventos estão lá”, aponta Gueg.

O produtor de rap conta ainda que, para o evento chamar o público e ter uma certa visibilidade a divulgação nas redes, deve começar aproximadamente um mês antes da data marcada. Além das redes sociais, com a postagem de cartazes online e vídeos, a promoção do movimento é realizada, ainda, pelo programa de tv Hip Hop PG, veiculado pela TV Educativa e apresentado por ele.

Mesmo com todas as possibilidades e plataformas de divulgação, Gueg afirma que elas não são suficientes. Para os eventos ganharem mais visibilidade seria interessante a sua difusão em rádios, banners, cartazes, painéis digitais, e quem sabe, outdoors. Na relação entre comunicação e cultura, Ismael Gueg opina: “A comunicação fortalece sim a cultura. Ela divulga os ‘trampo’, mas falta muito para aprender na questão de divulgação. Todo mundo está se esforçando, com certeza. Estão fazendo sua auto divulgação ou curtindo e compartilhando eventos”.

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