Museus abrigam marcas da história de Ponta Grossa

Por Matheus Dias

Os prédios que abrigam agências bancárias costumam ser bastante parecidos em algumas coisas. São cheios de vidros, concreto armado, pouca decoração, pouca pintura, pouca delicadeza, enfim, nada que sirva para agradar tanto aos olhos, já que o que importa lá são os dígitos das contas bancárias dos clientes. Quando um prédio que foi imaginado para abrigar uma agência bancária passa a ser a casa de um museu, a falta de vida do típico formato bancário também afeta a experiência de quem visita o museu.

É o que acontece com o Museu Campos Gerais. Esta casa cultural nasceu na década de 1950, concebida por um grupo de intelectuais cosmopolitas de Ponta Grossa, o Centro Cultural Euclides da Cunha. Em 1982 o grupo cedeu o acervo à Universidade Estadual de Ponta Grossa, que passou a ser responsável pela administração da entidade. A organização utilizava o prédio do antigo Fórum de Ponta Grossa, na esquina da Praça da Catedral, do começo do século XX.

Porém o prédio, muito antigo, começou a ter infiltrações e outros problemas estruturais. Quando o prédio que abrigava o acervo do Museu Campos Gerais foi tombado pelo Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), a entidade museológica mudou de lugar para que a antiga construção pudesse ser restaurada.

Restaurar não é o mesmo que reformar. Quando se restaura, o resultado final das obras deve ser o mais parecido possível com a construção original do prédio, em todos os seus aspectos, e são poucas empresas no estado do Paraná que prestam esse tipo de serviço.

Em 2003, portanto, o Museu Campos Gerais deixou o antigo Fórum da cidade e passou a operar no prédio do antigo Banco do Estado do Paraná (Banestado), que hoje pertence ao Banco Itaú Unibanco S.A. Em regime de comodato, o museu histórico opera até hoje no quadrático e envidraçado prédio bancário.

Segundo o coordenador do Museu Campos Gerais, professor Antonio Paulo Benatte, do Departamento de História da UEPG, o Museu opera com poucos recursos vindos da Universidade. O principal motivo para a falta de verba é o fato de a entidade estar atendendo em instalações provisórias (há 12 anos). A UEPG se recusou a comprar até um bebedouro para instalar no corredor do Museu e satisfazer a sede dos alunos das escolas municipais que visitam a casa.

“A Universidade não vai fazer grandes investimentos em um prédio que não é dela”, afirma o professor Paulo. No entanto, para que o Museu volte a operar em suas instalações originais, também é necessário dinheiro da UEPG. O restauro do prédio está finalizado, restando apenas a instalação de detalhes em sua estrutura que permitam que o acervo do Museu Campos Gerais não se danifique com as variações térmicas.

O projeto de restauração também previa a construção de um anexo ao prédio, um cômodo novo, em outras palavras, para guardar o acervo técnico da instituição, a parte que não é exibida. Mas, para que o prédio possa ser logo concluído, a coordenação do museu deseja retirar a construção deste anexo do projeto de restauração, agilizando as negociações com a UEPG.

Nos dias em que colégios das redes municipal, estadual e até privada de Ponta Grossa visitam o Museu Campos Gerais, a lista de visitação que fica na entrada guardada por um segurança chega a atingir 50, 60 ou até 70 nomes. Mas em dias normais, sem visitas agendadas por colégios, o museu recebe de 8 a 15 curiosos que resolvem dar as caras.

Quem for ao Museu Campos Gerais será acompanhado por um estagiário do curso de Turismo, que o orientará sobre as coleções em exposição e sobre sua importância material e imaterial. Além dos estagiários e da parte administrativa, pesquisadores ficam estudando o acervo no piso superior, ou fotografando os jornais do dia em uma máquina desenvolvida para isso. Tudo para recordações da posteridade.

O museu tem quatro exposições permanentes. A do piso superior tem animais empalhados, fósseis e insetos conservados à disposição. No piso do meio, artefatos de imigrantes russos, ucranianos, poloneses e japoneses exibem um pedacinho da árvore genealógica da cidade. No piso inferior, há uma exposição com artigos da Força Expedicionária Brasileira (FEB) e objetos de antigas salas de projeção cinematográfica.

A cada dois meses, muda-se a exposição temporária do piso central, mais próximo à entrada. Quando da apuração desta reportagem, estavam expostos objetos confeccionados por índios brasileiros. “Isso foi uma decisão nossa, de expor os indígenas como raíz étnica e cultural. Em muitos lugares, os índios são tratados como história natural, como animais”, relata o professor Paulo.

Apesar de o Museu Campos Gerais trazer em seu portfolio parte da história de Ponta Grossa, a Prefeitura da Princesa dos Campos não mantém nenhuma relação com a instituição, que é mantida com dinheiro do Estado. A Prefeitura também não tem diálogo com outro museu da cidade, de iniciativa privada.

Belle époque – O Museu Época

O prédio que abriga o Época é um museu por si só: uma construção de 1850, enfeitada e cheia de detalhes, característica típica da arquitetura oitocentista, e com parede e rebocos grossos, o que garante uma pequena variação térmica e, portanto, menos risco aos artefatos lá contidos.

O problema do Museu Época vem de outras fontes: a própria vida. O dono do Museu, Aristides Spósito, 75 anos, é um apaixonado por antiguidades e ama o que faz há 45 anos: administrar seu museu. Mas as coisas já não são tão fáceis para seu Aristides, que tem apenas 25% da audição e parte da visão comprometida.

Seu Aristides não cobra para que o público visite seu acervo, e também não recebe dinheiro público. Mantém seu Museu em operação através de apoios culturais com empresas da cidade, e conta com o apoio de familiares para algumas tarefas braçais mais pesadas.

O proprietário do Museu Época se revolta com o poder público em várias situações. Até mesmo no começo da entrevista, quando disse: “Vocês que são do jornalismo, não precisam vir falar comigo não. Vão atrás do governo, dos políticos, perguntar da saúde. Tem gente morrendo, cadê os tais médicos cubanos?”.

Ele critica o governo municipal quando o assunto é cultura: “Falta incentivo da Prefeitura, não só para os museus, mas para a cultura de forma geral. Nós passamos dificuldades, e a Prefeitura não é capaz de mover um dedo para auxiliar”, afirma.

Em maio de 2015, chegou a tramitar na Câmara um projeto que isentava os museus da cidade de pagar IPTU, além de perdoar as dívidas atuais. No caso do Época, os débitos com a Prefeitura chegam a 30 mil reais. No Brasil, apenas alguns museus recebem incentivo fiscal, como o Museu de Arte do Rio de Janeiro.

Casa da Memória

A Casa da Memória abriga um grande acervo de negativos fotográficos em vidro que registraram a rotina dos ponta-grossenses nos séculos XIX e XX. Essa obsoleta tecnologia exige vários cuidados devido à sua delicadeza. Pouca luz, embalagem adequada, catalogação, etc. E, graças à própria natureza dos artefatos, eles não podem ser expostos, ficando restritos a estocagem e eventuais pesquisas históricas.

Hoje, de acordo com o Instituto Brasileiro de Museus, a Casa da Memória pode ser considerada uma entidade museológica. Apesar da parte mais relevante de seu acervo ficar trancafiada em uma sala escura, em outros cômodos do antigo prédio ferroviário estão expostos objetos e fotos reveladas e ampliadas a partir dos negativos em vidro.

Embora seja um museu, do ponto de vista burocrático, a Casa da Memória não tem exposições rotativas, e exibe apenas o que contém e pode exibir. Seu acervo também conta com jornais impressos do começo do século passado, fotografados e catalogados.

Segundo o presidente da Fundação Municipal de Cultura, Luis Cirillo Barbisan, não há como mudar as estratégias de exposição da Casa da Memória: “Aquele material é muito sensível, nós não temos condições de fazer uma exposição maior, permitir um manuseio por qualquer um. Ele acaba ficando restrito à pesquisa, pois precisa ser manuseado por pessoas capacitadas”.

“O prédio que abriga a Casa da Memória hoje também não tem condições físicas para ampliação dos bens expostos. E, atualmente, nós não temos nenhum prédio público que seja mais adequado para conter o acervo pertencente à Casa da Memória”, conclui Cirillo.

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