“O show tem que continuar!” A luta das famílias circenses para sobreviver durante a pandemia

No último dia 27 de março foi comemorado o Dia Nacional do Circo. A data é em homenagem ao nascimento do palhaço brasileiro Abelardo Pinto, conhecido popularmente como Piolin, e considerado até hoje um dos maiores palhaços brasileiros. Piolin consagrou-se no universo circense e se tornou mundialmente conhecido nos anos 1920  por suas habilidades e criatividade no picadeiro.

   A arte circense é uma das mais tradicionais do país. Ela surgiu na Inglaterra no século XVIII e logo foi se espalhando por toda Europa. Registros históricos datam que ela chegou ao Brasil em meados do século XIX e persiste até hoje levando entretenimento e lazer para as pessoas. 

   Contudo, com o surgimento da pandemia de Covid-19, os circos vêm passando por diversas crises devido à impossibilidade da realização de suas atividades da maneira tradicional. O setor cultural foi um dos grandes impactados em decorrência da paralisação das atividades presenciais de maneira imediata em março de 2020. Lutando por sua sobrevivência, alguns desses espaços vêm se reinventando para continuar trazendo alegria por onde passam. Este é o caso do Circo Vostok, estabelecido atualmente em Curitiba.

   O circo, de origem russa, foi inaugurado no ano de 1873. Em seus 148 anos de existência, o Circo Vostok destaca como um dos grandes momentos de sua história a passagem por Las Vegas, durante os anos de 1970. Visto como um momento de reinvenção dos espetáculos circenses, o então proprietário, Alexandre Vostok, acabou por desativar o circo no Brasil e levar parte da trupe para as apresentações nos Estados Unidos. Foram quase quatro décadas entretendo o público norte-americano quando o filho de Alexandre, Fábio, decidiu que estava na hora de retornar ao lar. O picadeiro reabriu suas portas em solo brasileiro em 2011 com a proposta de resgatar as origens da família por meio de apresentações circenses tradicionais.

   Para Eros Vostok, relações-públicas do Circo Vostok e membro da sexta geração da família, a inovação é uma das principais qualidades que o circo tem a oferecer para seu público: “Estamos em constante evolução. E acho que isso nunca vai parar. O circo é a mãe de todas as artes e a inovação faz parte desses artistas”. Eros também relata que a diversidade de artistas e talentos é um elemento essencial para manter a magia circense viva. “Quem se acomoda nas cadeiras para assistir ao espetáculo só visualiza a diversidade artística que existe sob a lona de um circo. Abaixo das camadas de trajes e maquiagens, porém, se escondem as mais diversas histórias de vida, de trajetórias e de personalidades. Sonhos alcançados e outros no foco para se concretizarem se reúnem coletivamente, formando um imenso mosaico de experiências”, relata.

Eros Vostok em um dos espetáculos do circo. Foto: Acervo Circo Vostok.

   Com 105 integrantes na equipe de oito nacionalidades diferentes, sendo 48 artistas, o Circo Vostok é considerado um dos mais importantes circos de grande porte ainda em circulação no país. Atualmente toda a equipe sobrevive exclusivamente do circo, e manter a estrutura em dia é um dos desafios da administração. Eros Vostok destaca que a concorrência de novas tecnologias e o momento de crise econômica em que o Brasil se encontra chegam a influir no público dos espetáculos. Porém, a magia do picadeiro ainda atrai um grande número de visitantes, ávidos pelas surpresas e encantos que só ocorrem embaixo da lona de um circo.

   Por conta da pandemia da Covid-19, o modelo de espetáculo tradicional está parado há cerca de um ano. Eros também comenta a respeito das dificuldades enfrentadas pela equipe: “Estamos sem trabalhar com o público diretamente desde que começou a pandemia. E durante esse tempo, a gente não recebeu nenhum auxílio do governo. A nossa única renda é a bilheteria”, afirma. A solução encontrada para a família e seus artistas se manterem durante o período de isolamento social foi a realização de espetáculos em formato drive-in, tipo de evento em que as pessoas podem assistir as atrações do circo de dentro de seus próprios carros. Com uma estrutura semelhante à de um picadeiro, em que o palco é o elemento central do espaço, os carros podiam ser estacionados de maneira circular envolta do local de apresentação.

Projeto virtual do drive-in do Circo Vostok.

   Ele relata que foi possível realizar apresentações no formato drive-in durante três meses, mas por conta dos últimos decretos divulgados pelo governo estadual do Paraná, impondo medidas mais restritivas contra a Covid-19, as atividades do Circo Vostok precisaram ser paralisadas novamente. Eros ressalta que a família espera ansiosamente que os casos e mortes por conta do coronavírus diminuam para que eles possam retornar às atividades e continuar trazendo alegria para as pessoas em tempos difíceis como este.

   A história da família Vostok sensibilizou muitos fãs do trabalho realizado pelos artistas circenses. A influenciadora digital curitibana, Natália Amend, foi uma delas. Após encontrar integrantes do circo vendendo algodão doce, maçãs do amor e bolas coloridas infláveis nas ruas da capital paranaense no início da pandemia, ela abriu uma vaquinha online de arrecadação voluntária. A vaquinha segue até hoje em execução, e já arrecadou mais de dois mil reais para ajudar a custear as despesas da equipe enquanto cumprem o isolamento social.

   Eros enfatiza a importância da união familiar para manter a cultura circense viva até os dias atuais: “O desenvolvimento da arte circense muitas vezes está ligado a saberes passados de geração para geração, o que é muito interessante. O circo é uma arte milenar passada de pai para filho, e para mim, é a arte mais pura que existe. O circo é magia, é alegria e é felicidade”.

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