Ponta Grossa Ambiental entra com novo pedido para construção de aterro sanitário em área da Escarpa Devoniana
A empresa Ponta Grossa Ambiental (PGA) retomou a iniciativa para obter o licenciamento para a construção de aterro sanitário em Ponta Grossa em área da Escarpa Devoniana. O empreendimento denominado CEAPG/Ponta Grossa Ambiental S/A está previsto para ser construído próximo aos limites do Parque Nacional dos Campos Gerais (PARNA Campos Gerais) e vizinho da Fazenda Escola da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG).
O pedido da PGA foi enviado ao Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), através do Requerimento de Licenciamento Ambiental em 8 de outubro deste ano. O parecer do Ibama emitido em 13 de novembro passado foi que, devido ao empreendimento estar localizado na área da Escarpa Devoniana, a competência para análise do pedido de licenciamento seria de órgão estadual: Trata-se de uma unidade de conservação de esfera estadual — a Área de Proteção Ambiental Estadual da Escarpa Devoniana — cuja intervenção não atrai competência federal, (…) que exclui as Áreas de Proteção Ambiental (APAs) da competência da União”.
O parecer do Ibama teve como base o artigo 7º, inciso XIV, da Lei Complementar no 140/2011, que estabelece competências para órgãos da União. No parecer, o órgão fez o seguinte despacho: “Embora a localização do empreendimento não atraia competência federal, aterros sanitários são atividades sujeitas ao licenciamento ambiental, devendo ser regularizadas junto ao órgão ambiental competente no âmbito estadual”. E concluiu: “Diante do exposto, comunicamos o encerramento do processo no âmbito do IBAMA, por ausência de competência legal para o licenciamento ambiental do referido empreendimento”. Esta reportagem do Pauta Ambiental teve acesso com exclusividade à íntegra do processo através da Lei de Acesso à Informação, encaminhado ao Ibama pela plataforma FalaBR.
De acordo com as informações da Ficha de Caracterização da Atividade (FCA) que consta no processo, o projeto da PGA tem a finalidade de regularizar o Aterro Sanitário de Classe II, que se encontra desativado. A área descrita no documento é de 0,1346 hectares (1.346 metros quadrados) e capacidade para 400 milhões de toneladas de resíduos.
“Isso é uma vergonha”, disse o professor pesquisador do Departamento de Agronomia da Universidade Estadual de Ponta Grossa, Carlos Hugo Rocha, consultado por essa reportagem sobre o parecer do Ibama. O professor destacou que o próprio Ibama e o ICMBio já haviam emitido pareceres contrários ao aterro sanitário no local. “Desde 2009, existe esta sombra do aterro nos fundos da Fazenda Escola. Estamos sabemos que a PGA vai solicitar um novo processo, porque o anterior foi anulado”, disse Rocha.
Em 2009, quando iniciou a construção do aterro naquela área, a Justiça Federal do Paraná determinou que a empresa suspendesse todas as atividades no local, considerando os riscos ambientais. Na época, o ICMBio confirmou a possibilidade de o chorume do aterro sanitário atingir a bacia de manancial que abastece o município de Ponta Grossa. “Eles escolheram o pior lugar do ponto de vista ambiental, zoológico, econômico, de funcionalidade, porque era terreno que pertencia à família dos proprietários da Ponta Grossa Ambiental”, disse a essa reportagem o geólogo e professor aposentado da Universidade Estadual de Ponta Grossa, Mário Sérgio de Melo, um dos responsáveis pela ação impetrada na Justiça Federal e que resultou na suspensão da construção do empreendimento em 2009.
Em 6 de agosto de 2014, a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) acatou recurso da PGA e concedeu liminar autorizando a construção do aterro sanitário. Em 6 de abril de 2016, a 1ª Vara Federal de Ponta Grossa condenou por crime ambiental a Ponta Grossa Ambiental e o presidente da empresa, Marcus Vinicius Nadal Borsato.
O advogado Marcius Nadal Matos, que representou a ação judicial movida por pesquisadores e ativistas ambientais contra a instalação do aterro sanitário em 2009, explica que a disputa judicial foi longa e marcada por decisões divergentes entre a Justiça local e o Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Segundo ele, embora a ação tenha suspendido o licenciamento por anos, a empresa obteve decisão que permite retomar o processo desde que receba novo aval dos órgãos federais, como o ICMBio e o Ibama. “Eles vão conversar com o ICMBio e se o ICMBio liberar, acabou”, disse Matos.
Na época, o grupo de pesquisadores emitiu um parecer técnico apontando irregularidades no projeto apresentado pela empresa Ponta Grossa Ambiental. “Nos pareceu o lugar mais inadequado do ponto de vista ambiental para um aterro. Era sobre a área de recarga do aquífero [Furnas] e dentro da unidade de conservação”, explica Melo. O geólogo destaca que o projeto não mencionava as nascentes existentes naquela área, “As conclusões contrariavam os próprios dados da empresa com inconsistências graves”.
O geólogo explicou que o empreendimento fica sobre a área da principal zona de recarga do Aquífero Furnas, uma formação rochosa que tem espaço vazio e poroso, que acumula água que abastece poços artesianos de empresas e indústrias em Ponta Grossa. “É a área onde a água da chuva penetra diretamente na rocha e abastece o aquífero. Instalar um aterro ali é colocar em risco a principal fonte de água subterrânea da cidade”, alertou o pesquisador. Melo ressaltou ainda: “Veja quantos poços que não devem ter sido perfurados na cidade? Para quem usa muita água, é muito importante. É muito conveniente você explorar a água do Furnas, porque é uma água de boa qualidade e você não depende do fornecimento da Sanepar”.
PGA, IAT e Prefeitura não respondem à reportagem
A equipe de reportagem entrou em contato com a empresa Ponta Grossa Ambiental (PGA) Instituto Água e Terra/Regional Ponta Grossa e com a Prefeitura Municipal de Ponta Grossa, mas não obteve respostas até o fechamento desta reportagem. Nas mensagens, a reportagem consultou se houve pedido de licenciamento da PGA aos órgãos estaduais/locais para retomada do empreendimento na região de Ponta Grossa.
Para PGA, foi enviado e-mail para o presidente da empresa, Marcus Vinícius Nadal Borsato, pelo mesmo endereço eletrônico descrito no relatório do Ibama à empresa. Ao IAT local, foi feito contato várias vezes por telefone e e-mail oficial do órgão e chefe regional, Matheus Lopes Demito, mas sem retorno. À Secretaria Municipal do Meio Ambiente, foi enviado e-mail para a secretária Carla Martins Kritski, através da assessoria de imprensa da Prefeitura de Ponta Grossa e contatos por telefone, também sem retorno.
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Por Amanda Grzebieluka, estudante do 3º ano do Curso de Jornalismo da UEPG, bolsista do serviço de extensão Pauta Ambiental.
Foto: Julia Almeida e Pedro Moro
