Os números jogam contra você: um em cada 50 milhões conquistam a Mega-Sena

Probabilidade de acerto  é extremamente baixa, tornando o prêmio milionário um desafio estatístico para os apostadores da “fezinha”

No Brasil, a probabilidade de uma pessoa morrer atingida por um raio é de 1 em 25 mil, de acordo com o levantamento realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Embora pareça ser um evento raro, a chance ainda é significativamente maior do que a de ganhar em jogos de azar. Milhões de brasileiros apostam todos os dias, confiantes de que podem ser a exceção à estatística. Mas até que ponto a sorte pode realmente superar a matemática?

Os jogos de azar existem há séculos. Diversas civilizações praticavam apostas esportivas, como são os casos  da Grécia Antiga e do Império Romano. Conforme aponta a World History Encyclopedia, o Anfiteatro Flaviano, conhecido popularmente como Coliseu Romano, foi um dos principais ambientes que promoviam apostas e o entretenimento da população de Roma. Nele, ocorriam cenários de lutas sangrentas entre gladiadores.

Segundo pesquisa do Jornal Pequeno – O órgão das multidões, com o passar do tempo, surgem as primeiras casas de apostas, estabelecimentos que oferecem entretenimento por meio de jogos de azar, nos quais os jogadores apostam dinheiro. Historicamente, esses locais eram frequentados por pessoas de alta sociedade. Por esse motivo, as casas de apostas são associadas ao luxo e glamour. Ao longo do século XX, os cassinos tornaram-se cultura de diversas cidades pelo mundo. Nova Orleans e Las Vegas são cidades norte-americanas que se desenvolveram economicamente por meio das atividades promovidas pelos cassinos. 

De acordo com a Revista SuperInteressante, os cassinos chegaram ao Brasil logo após a vinda da Família Real Portuguesa, em 1808. Naquela época, casas de apostas já eram famosas na Europa. Em 1917, Venceslau Brás, presidente do Brasil, decretou a primeira proibição dos cassinos no país. Mesmo com a proibição, existiam muitos estabelecimentos clandestinos que promoviam as jogatinas. 

Durante o governo  de Getúlio Vargas, em 1934, os jogos de azar voltaram a ser legalizados. O Cassino da Urca, localizado no Rio de Janeiro, foi um dos símbolos do crescimento econômico impulsionado pelas apostas no Brasil. O  estabelecimento  funcionou de 1933 a 1946, ano  em que o presidente Eurico Gaspar Dutra assinou o Decreto-Lei N° 9.215, proibindo a prática e a oferta de jogos de azar em todo o território brasileiro. De acordo com o Parágrafo 3° do Artigo 50 da Lei das Contravenções Penais (Decreto-Lei N° 3.688, de 1941), os jogos de azar são proibidos no Brasil, pois dependem unicamente da sorte, sem considerar a habilidade dos apostadores.

Crédito: Gabriela Denkwiski

 

Airton Kist, membro do Núcleo de Estudos e Pesquisa em Estatística (Nepe) do Departamento de Matemática e Estatística da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), explica que a probabilidade de ganhar em jogos de azar é calculada com base na quantidade de resultados possíveis e varia entre 0 (algo impossível de ocorrer) e 1 (quando há certeza absoluta de ocorrer). “A indústria de jogos de azar é altamente regulamentada para garantir a aleatoriedade dos resultados dos jogos. Qualquer pessoa que afirme ter um sistema infalível para ganhar está provavelmente tentando enganá-lo”, explica. Enquadram-se como jogos de azar o bingo, as máquinas caça-níqueis, os jogos de dados, roleta e alguns jogos de carta, como o pôquer.

Em jogos baseados inteiramente na aleatoriedade dos acontecimentos, como a roleta, caça-níqueis e a loteria, cada jogada ocorre de forma independente. Isso quer dizer que os resultados anteriores não irão afetar os resultados posteriores. Entretanto, em jogos que envolvem um nível de habilidade (pôquer, por exemplo), as escolhas feitas pelo jogador impactam no resultado da jogatina. “Mesmo com estratégias, a sorte ainda desempenha um papel significativo. A vantagem da casa correta ainda existe, embora possa ser minimizada por meio de decisões inteligentes”, diz Kist.

A Mega-Sena é um dos jogos de azar mais populares do Brasil e movimenta milhões de apostas semanalmente. Por vezes é vista como uma chance de mudar de vida, da noite para o dia. Criada pela Caixa Econômica Federal, a Mega-Sena enquadra-se como uma loteria. Os sorteios ocorrem três vezes por semana, às terças-feiras, quintas-feiras e sábados. Além das jogatinas semanais, existem sorteios especiais realizados pela Caixa, como é o caso da Mega da Virada, realizada no último dia do ano. ​

O jogo consiste em escolher 6 números entre 1 e 60. O jogador tem chance de ganhar em três modalidades diferentes: sena (quando acerta os seis números escolhidos), quina (quando acerta cinco dentre os seis números) e quadra (quando acerta apenas quatro números). O número de pessoas que jogam semanalmente na Mega-Sena varia conforme o valor do prêmio e se houve acúmulo nos sorteios anteriores. A Caixa divulga os resultados mas não  o número exato de apostas realizadas. O número de ganhadores na quadra, quina e sena é utilizado como parâmetro para se ter uma ideia da distribuição de acertos. Para calcular a probabilidade de ganhar em cada uma das possibilidades utiliza-se o conceito matemático de combinação.

O professor Airton  Kist explica ainda que acertar as seis dezenas da Mega-Sena é apenas uma entre 50 milhões de tentativas. Já a quina é uma para mais de 150 mil e a quadra é uma em dois mil. .  Imagine uma amostra de 200 pessoas que apostam na Mega-Sena: 197 acertariam só a quadra, três fariam a quina — e ninguém levaria o prêmio máximo. Para surgir apenas um ganhador da sena, seria preciso multiplicar esse grupo por 10 mil. Em outras palavras, seriam necessárias 2 milhões de apostas para que, talvez, uma única pessoa desafiasse as estatísticas e faturasse o grande prêmio. 

Crédito: Gabriela Denkwiski

A matemática deixa claro: a chance de perder em uma aposta de jogatinas de azar é imensamente maior do que a chance de ganhar. Embora a loteria seja legalizada, os jogadores devem ser conscientes ao apostar, já que existe grande risco de perda. “Dependendo de quantas apostas a pessoa faz durante a vida, ela tem mais chances de ser atingida por um raio do que de ganhar um prêmio relevante numa loteria”, finaliza Kist. 

Esta reportagem integra uma coletânea de livro-reportagem investigativo. Este capítulo trata sobre como as estatísticas comprovam que é muito difícil ganhar na mega-sena. Acompanhe no Periódico as próximas publicações.

Ficha técnica

Produção: Gabriela Denkwiski

Edição e publicação: Juliana Emelly e Maria Cecília Mascarenhas 

Supervisão de produção: Hendryo André

Supervisão de publicação: Aline Rosso e Kevin Furtado

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