Versões “tipo” trocam qualidade por menor preço nos supermercados

Itens mais baratos utilizam fórmulas alternativas que reduzem custos, mas enganam na comparação aos tradicionais. Foto: Eder Carlos

Em um dos atacarejos de Ponta Grossa, a doméstica Jaqueline Moraes segura uma embalagem de mistura láctea enquanto observa as caixas de leite condensado e seus preços na prateleira. A diferença de custo é grande. A primeira fica na casa dos R$ 3,00, enquanto os segundos custam o dobro.

Em outro mercado, uma cena semelhante acontece. Na geladeira, lado a lado, estão iogurtes e bebidas lácteas. Adona de casa Narcele Guimarães,, fica em dúvida sobre qual escolher. Pelo preço, as segundas são mais baratas e “cabem no bolso para dar para as crianças”, diz ela.

Nem Jaqueline nem Narcele sabem explicar qual a diferença entre os produtos. A escolha acaba sendo pelo preço. Acreditam que todos sejam a mesma coisa, apenas com nomes e preços diferentes. A quantidade de produtos que parecem, mas não são os mesmos é grande. Vão de tradicionais iogurtes a embutidos, sucos e biscoitos. Uma atenção aos rótulos e o consumidor verá que muitos produtos têm pouco dos ingredientes originais de formulação e muitos compostos químicos para imitar o sabor prometido nas embalagens.

A nutricionista Fernanda Mattos explica que alimentos como as bebidas e as misturas lácteas substituem todo ou parte do leite que originalmente vão em suas receitas por componentes como soro de leite. Este é o resíduo que sobra da produção de queijos, e é reaproveitado em outros produtos. Com isso, o custo fica menor e pode ser oferecido mais barato ao consumidor que o adquire, que nem sempre sabe, ao certo, o que está levando. E, quando expostos junto aos produtos originais nos supermercados, , acabam induzindo o consumidor à recorrer ao mais barato. 

Versões alternativas, mais baratas, mas com menos nutrientes e mais aditivos. Foto: Eder Carlos

No setor de embutidos de outro mercado, Rodolfo Martinscoski dos Santos, aposentado, escolhe uma linguiça “tipo” calabresa da pilha à sua frente. A ideia é “fazer um feijão mais rico”, diz ele. Perguntado por que o embutido é “tipo” e não só calabresa, ele também não soube explicar. A diferença, mais uma vez, está nos ingredientes. Enquanto na original vão apenas carnes nobres, no “tipo” são aproveitados retalhos e raspas que normalmente não fazem parte da receita. O objetivo, mais uma vez, é reduzir o preço oferecendo um produto de menor qualidade.

Fernanda explica também que várias indústrias optam por substituir ou reduzir a quantidade de ingredientes da receita como forma de baixar custos ou e até mesmo ingressar em outra forma de cobrança de impostos. Ela cita como exemplo dois bombons famosos, um com invólucro vermelho e outro amarelo, que mudaram de embalagem para perder a característica de “bombom” e enquadrarem-se  como outro produto na cobrança de tarifas de comercialização.

Para a nutricionista, a principal diferença é a qualidade dos produtos oferecidos. Os alimentos “tipo”, ou seja, os que não são exatamente o que aparentam ser, oferecem ingredientes de menor qualidade e, portanto, não possuem os benefícios nutricionais dos originais. O leite, por exemplo, possui nutrientes que são perdidos na produção de queijo e não estão presentes no soro de leite usado na produção de bebidas e compostos lácteos. Assim, esses produtos são mais pobres que o iogurte ou o leite condensado. Da mesma forma, os produtos vendidos como “néctar de frutas” contêm somente uma pequena porcentagem de suco natural da fruta, além da adição de açúcar e outros componentes químicos. A dona de casa Narcele Guimarães diz que a opção mais barata é a única que cabe no orçamento apertado da família. Seu marido, trabalhador da construção civil, “não ganha o suficiente para comprar do mais caro”. Assim, para ela, a diferença que conta é a do valor financeiro e não nutricional. O mesmo acontece para muitas outras famílias que, sem recursos para o produto original, acabam optando pela “imitação” mais em conta.

Já para Rodolfo, não há outra opção. Em busca em quatro supermercados e atacarejos famosos da cidade, encontrou apenas a linguiça “tipo” calabresa. Em nenhum havia o produto original.

Produtos parecem iguais, mas a fórmula muda a qualidade. Foto: Eder Carlos

O que dizem as indústrias?

Em contato com indústrias de diferentes produtos, como Aurora, Tirol e Perdigão, buscamos entender suas posições em relação às produções.  “Sou consumidor de seus produtos. Recentemente, ao comprar um iogurte para meu neto, percebi que vocês têm duas linhas: iogurte e bebida láctea. Gostaria de saber qual a diferença entre os dois. Ambos são produtos confiáveis e podem ser destinados a crianças?”, questionamos. Apenas a Tirol respondeu. “O iogurte é produzido através da fermentação do leite, em quais bactérias como Lactobacillus bulgaricus e Streptococcus thermophilus transformam a lactose em ácido lático. Essa ocorrência dá ao iogurte sua textura cremosa e seu sabor característico. Ele é uma ótima fonte de proteínas, cálcio e probióticos, que auxilia na saúde do intestino e do sistema imunológico. Já as bebidas lácteas podem ser feitas utilizando leite ou soro de leite, além de outros ingredientes como açúcares, amidos, estabilizantes e aromatizantes. A composição nutricional dessas bebidas pode variar bastante, dependendo do que é adicionado. Em geral, eles têm uma textura mais líquida, sabor mais suave e podem conter menos ou nenhuma cultura de bactérias vivas, dependendo do produto, podem ter menos proteínas, cálcio e probióticos do que o iogurte”, afirmou.

As demais empresas pediram telefone de contato, mas não retornaram. Além disso, passaram a enviar propaganda de seus produtos, sem a resposta solicitada. Caso haja retorno, a reportagem será atualizada.

 

Ficha técnica

Produção: Eder Carlos

Edição e publicação: Sabrina Waselcoski, Emanuely Almeida e Eduarda Gomes

Supervisão de produção: Carlos Alberto de Souza

Supervisão e publicação: Aline Rosso e Kevin Kossar Furtado

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