ECONOMIA SOLIDÁRIA E AGROECOLOGIA: Fomento a Redes e Grupos de Consumo de Alimentos Agroecológicos em Ponta Grossa
Autores: Adriano da Costa Valadão; Rafaela Ribas Bueno; Reidy Rolim de Moura
Resumo: O objetivo deste texto é avaliar e discutir os resultados das experiências de extensão universitária na articulação e fomento à redes e grupos de consumidores de produtos agroecológicos realizadas pelo Programa de Extensão IESol- Incubadora de Empreendimentos Solidários da UEPG. As articulações destas redes fizeram parte do trabalho de extensão da IESol através de vários projetos apresentados durante os anos de 2014 e 2024. Para este trabalho foi realizada uma abordagem qualitativa através da verificação de relatórios e da observação participante. Destaca-se como ponto comum das seis redes de consumidores já articuladas pela IESol, a importante geração de renda que proporcionou, a permanência na terra, o acesso de consumidores a produtos agroecológicos a preço justo e como limite a falta de pró-atividades dos consumidores nas redes.
Palavras-chave: Consumo Responsável e Solidário, Produtos Agroecológicos, Extensão
JUSTIFICATIVA
A IESol – Incubadora de Empreendimentos Solidários é um Programa de Extensão da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), que se iniciou em 2005 e que atua desde o ano de 2007 junto a grupos de agricultores agroecológicos vinculados ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na região de Ponta Grossa. Em sua história, a dificuldade mais frequente apontada pelos grupos, está ligada a comercialização com uma remuneração justa pelo trabalho do agricultor. Além da participação em feiras de economia solidária e agroecológicas. Por outro lado, diversos grupos de consumidores, com desejo de consumir produtos orgânicos, não o fazem por dificuldade no acesso ou pelos valores muito altos geralmente praticados em mercados tradicionais. Desta forma, buscando melhores condições de comercialização e conscientização de um mercado crítico, a IESol tem desde o ano de 2014 trabalhado com o fomento e articulação de Redes de Consumidores e Produtores Agroecológicos através de diversas ações de extensão, faz-se necessária a avaliação destas ações.
OBJETIVOS
O objetivo deste resumo é avaliar e discutir os resultados das experiências de extensão universitária ao fomentar redes de produtores e grupos de consumo de produtos agroecológicos através do trabalho do Programa de extensão IESol/UEPG.
METODOLOGIA
O trabalho possui cunho qualitativo realizado através da análise de documentos e da produção bibliográfica e da observação participante de autores ligados ao próprio programa de extensão IESol. As ações fazem parte do processo de incubação dos grupos de economia solidária, que tem como base as fases Pré-incubação (aproximação, diagnósticos e adesão do grupo à economia solidária); incubação (formação e busca de soluções para os problemas apresentados e demandas do grupo); desincubação (ampliação da autonomia do grupo) (Valadão et al., 2018) e com o aprimoramento desta metodologia básica ainda apontamos a fase de Pós-incubação (autonomia e apoio do grupo a ações da IESol e encaminhamentos pontuais de novas demandas). Essa metodologia não tem um roteiro fixo, nem tempos rígidos, pode avançar, retornar, se entrecruzar e até reiniciar a partir de cada contexto específico, podem deve encaminhar para um resultado esperado e em comum acordo entre equipe da IESol os grupos de economia solidária.
RESULTADOS
A economia solidária (ECOSOL) e a agroecologia tem se constituído como campos de conhecimento e contestação social (Schimidt, 2008). Sendo a ECOSOL articulada principalmente através do trabalho coletivo, autogestão, solidariedade e sustentabilidade, voltada a perspectiva de valorização do sujeito e suas relações sociais, na produção e reprodução social do ser. Já a Agroecologia, em uma perspectiva crítica ao agronegócio, destaca que a produção sem uso de insumos químicos, depredação da natureza e superexploração de mão de obra e respeitando elementos sócio-culturais de populações camponesas, entre outras questões é possível. É um campo de conhecimento que considera que a produção agropecuária deve levar em conta não apenas aspectos econômicos, mas também sociais e ambientais. (Altieri, 2004).
Neste contexto, a partir do trabalho da IESol, alinhando ECOSOL e agroecologia, busca-se trabalhar buscando aliar os dois campos e articulando canais alternativos de comercialização. Um dos canais é a Feira de Economia Solidária da Universidade Estadual de Ponta Grossa (FESU), realizada semanalmente no Campus Central, oportunizando mais que um local para comercialização, mas sendo também um momento de formação e de realização de atividades culturais tanto dos feirantes, como do público presente.
Entretanto, a feira apresenta limites, principalmente em relação ao volume comercializado, movimento de pessoas dentro do campus, fechamento da feira em períodos de férias, entre outros. Desta forma foram propostas a organização de redes entre consumidores e grupos de agricultores como forma de melhorar o processo de comercialização, buscando criar um canal para a comercialização dos produtos agroecológicos diretamente com consumidores que não frequentavam a feira por vários motivos, bem como avançar na discussão de um consumo crítico. A inspiração para a organização de Redes de Produtores e Grupos de consumo vieram de experiências europeias de circuitos curtos de comercialização de produtos agrícolas e locais (Dalrot et al. 2018), além de experiências de grupos de consumo responsável no Brasil, na qual destacamos as quais foram fomentadas diretamente por incubadora de economia solidária como a Rede Trem Bão na região de Assis em São Paulo (Carvalho, Lauer e Basoli, 2023) e o grupo de consumo Bem da Terra em Pelotas no Rio Grande do Sul (Cruz, 2020).
Entre os anos de 2013 a 2022 foram organizadas seis experiências de redes entre produtores e consumidores. Estas surgiram em alguns contextos específicos, entretanto, possuíam em comum as dificuldades dos agricultores em atuar no processo de comercialização de forma não subordinada ao mercado convencional. Essas experiências tiveram um período de duração entre 1 a 5 anos e encerraram por motivos diversos, mas estavam ligados a mudanças de pessoas nos grupos (por motivo de estudo ou tratamento de saúde); por desinteresse dos consumidores (modelo cesta com produtos escolhidos pelos próprios produtores) ou por resolver um problema imediato (alta produção destinada à política públicas suspensas) ou grande aumento de volume comercializado nas políticas públicas.
Como ponto comum entre todas essas redes, está a geração de renda, seja de forma mais prolongada ou para resolver um problema específico. No primeiro caso, alguns grupos mantiveram estas redes por um período de 3 a 5 anos. As redes com duração mais curta, encerraram principalmente por um grupo de consumidores não mostrar consistência e o formato da rede de cestas fechadas (produtos escolhidos pelos próprios agricultores) ou a concepção da Rede estava ligada a resolver um problema a curto prazo, a qual estava ligada em grande produção entre as famílias e que atendiam programas institucionais de aquisição de alimentos e que decorrentes de questões políticas foram repentinamente encerrados (em pouco tempo os produtores já se rearticular com outros projetos e replanejamento da produção).
Da mesma forma, a articulação dos consumidores destas redes eram realizadas por meio de inicialmente articular um pequeno grupo de consumidores (em algumas vezes iniciando com membros da própria IESol) e ampliando aos poucos para verificar possíveis problemas e para os agricultores aos poucos irem ajustando e planejando a produção. Destaca-se ainda que a discussão dos preços dos produtos tinham como base uma noção de preço justo e solidário. Essa noção remete a um preço que fosse justo não só para o produtor, mas também para o consumidor. Ou seja, neste caso, os preços não são tão baixos como usualmente é pago para agricultores (em questões de revenda) e nem tão alto como é pago pelos consumidores por produtos orgânicos em supermercados ou lojas especializadas. Em geral, os consumidores apontavam que os preços se aproximavam do valor usual dos produtos convencionais em supermercados e feiras (Wynnek, 2022).
Destacamos a Rede de Produtores e Consumidores Maria Rosa do Contestado, ligado ao assentamento também chamado Maria Rosa do Contestado na cidade de Castro. Funcionando entre os anos de 2019 e, sendo suspensa em 2024. Esta rede proporcionou uma importante geração de renda para famílias acampadas, mantendo-as na terra e conseguindo comercializar boa parte de sua produção. Ainda os recursos levantados apoiou durante o período da pandemia o acesso pelas famílias às notas de produtores e consequentemente a possibilidade de comercializarem também via políticas públicas. Articulação de um grupo de consumidores que também apoiavam as famílias em suas lutas, incluindo no processo judicial que ocorreu durante a implantação do Assentamento. Ainda levou o grupo a ter força política para reivindicar um local de comercialização na cidade de Castro, onde a prefeitura instalou o Mercado do Produtor, realizando a comercialização direto com a população local.
Destacamos que como ponto negativo, a dificuldade de articular e fomentar um papel mais ativo dos consumidores de forma geral. Dessa forma, na maioria eles se restringiam ao papel de consumidores, pouco assumindo atividades nas redes, em alguma medida apenas realizando exigência e em alguns casos não apontando problemas por seu comprometimento militante com as causas dos movimentos sociais. A falta de organização dos consumidores foi um limitante para as redes avançarem e perpetuar, destacamos que Cruz (2020, p. 5) descreve que “não há GCR [Grupo de Consumo Responsável] sem consumidores/as organizados/as”.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considera-se que a partir do trabalho de extensão na articulação de Redes de Consumidores de Produtos Agroecológicos, apresenta um caminho promissor para escoar a produção agroecológica, fazer esta produção chegar a preços justos aos consumidores, principalmente os que não são beneficiados por políticas públicas de aquisição de alimentos.
A integração entre economia solidária (ECOSOL) e agroecologia, promovida pela IESol, demonstrou potencial ao criar canais alternativos de comercialização, como a Feira de Economia Solidária da UEPG (FESU). A experiência da Rede de Produtores e Consumidores Maria Rosa do Contestado, mostrou-se eficaz em proporcionar renda e apoio político às famílias assentadas, mas também enfrenta dificuldades na mobilização ativa dos consumidores. Essas limitações reforçam a importância de estar atento a essas demandas e pensar em estratégias de promover mais, especialmente dos consumidores para o sucesso e a sustentabilidade de tais redes. Por fim, as ações de extensão tem potencial para desenvolver abordagens e metodologias para a formação e conscientização dos consumidores em ter um papel mais pró-ativos nos grupos e assumir eventualmente a gestão dos grupos de consumo quando fomentados por incubadoras de economia solidária ou outra organização.
APOIO
Ao longo do período destes projetos as ações tiveram apoio do Programa SETI – Secretaria, Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, em consonância com a USF – Universidade Sem Fronteiras e ao apoio da Pró-Reitoria de Extensão e Assuntos Culturais – PROEX /UEPG, através da concessão de bolsas de extensão.
REFERÊNCIAS
ALTIERI, M. Agroecologia: a dinâmica produtiva da agricultura sustentável. 4.ed. Porto Alegre: UFRGS, 2004.
CARVALHO, A.M.R.; LAUER, E.C.; BASOLI, L.P. Rede de comercialização solidária Tem Bão. In: RAMOS, P.C. et al. Periferias no plural. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2023. E-book. Disponível em: https://library.fes.de/pdf-files/bueros/brasilien/20799.pdf#page=203. Acesso em 30 jul 2024.
CRUZ, A.C.M. Para uma metodologia de incubação de grupos de consumo responsável – alternativas para a comercialização na economia solidária e agroecologia. Econ. e Desenv., Santa Maria, v.32, ed. esp., e7, p. 01 – 05, 2020. Disponível em https://doi.org/10.5902/1414650941454. Acesso em 30 jul. 2024.
DALROT, M.R.; LAMINE, C.; BRANDENBURG, A.; ALENCAR, M.C.F.; ABREU, L.S. Redes alimentares alternativas e novas relações produção-consumo na França e Brasil. Ambiente e Sociedade. São Paulo, v. XIX, n. 21. p. 1-22. Abr-jun, 2018. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1809-4422ASOC121132V1922016. Acesso em 30 jul. 2024.
SCHMITT, C.J.; TYGEL, D. Agroecologia e Economia Solidária: trajetórias, confluências e desafios. In: Petersen,P. (Org.). Agricultura familiar camponesas na construção do futuro. Rio de Janeiro: AS-PTA, 2009. Disponível em: https://aspta.org.br/files/2011/05/N%C3%Bamero-especial.pdf#page=105. Acesso em 15 set. 2024.
VALADÃO, A.; BRASIL, F.; CUNHA, L.; BRASIL, M.; MOURA, R. R. Incubadora de Empreendimentos Solidários – IESol. In: VALADÃO, A. et al (Orgs.). Percursos e experiências da incubadora de empreendimentos solidários. Ponta Grossa: UEPG: Estúdio Texto, 2018. p.13-32.
WYNNEK, Caroline. O perfil socioeconômico e as motivações dos consumidores da rede de comercialização do Acampamento Maria Rosa do Contestado pelo consumo de agroecológicos. Trabalho de Conclusão de Curso Serviço Social. Universidade Estadual de Ponta Grossa. 2022.