Rede do CAPS de Ponta Grossa opera com falta de profissionais

Rede do CAPS de Ponta Grossa opera com falta de profissionais

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O serviço dos Centros de Atendimentos Psicossociais (CAPS) está presente em Ponta Grossa desde 2004. A cidade possui três unidades de atendimento: especializadas em álcool e drogas, transtornos mentais e cuidados com crianças e adolescentes, nos bairros Nova Rússia, Santa Paula e Uvaranas. Em uma das unidades, o CAPS Álcool e Drogas (Ad) em Uvaranas, 8 mil pacientes já foram atendidos desde 2006 e, atualmente, 300 pacientes são recorrentes. Contudo, profissionais da instituição afirmam que a quantidade de funcionários não é suficiente para o atendimento completo do sistema. Além da atenção integral, o CAPS atende demandas judiciárias dos pacientes, administra os grupos terapêuticos e faz visitas à domicílio.
O serviço funciona 24 horas por dia com equipes de assistentes sociais, psicólogos, técnicos de enfermagem e médicos, além de ser gratuito e sem necessidade de encaminhamento médico. O acompanhamento pelas unidades dos CAPS é feito de forma voluntária pelos pacientes, o sistema não força e nem obriga o acompanhamento, além de ser considerado um serviço de portas abertas. O serviço de atendimento psicossocial foi consolidado a partir da Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011 do Ministério da Saúde, que estabelece as diretrizes de funcionamento e estrutura da Rede de Atenção Psicossocial do país.
A cidade tem três tipos de CAPS. O CAPS Infanto Juvenil (IJ) é responsável pelo atendimento de menores de idade, crianças e adolescentes com dependência em álcool ou drogas. O CAPS II, especializado em casos de transtorno mental grave e persistente, ou em sofrimento mental. Ponta Grossa também possui um Ambulatório de Saúde Mental (AMS), que oferece atendimentos psiquiátricos e psicólogos, terapias ocupacionais e auriculoterapia. O serviço do AMS realiza agendamentos prévios por telefone ou presencial para acolhimentos, mas necessita de encaminhamento de alguma Unidade de Saúde. Outra unidade é o CAPS-Ad de Uvaranas. Segundo o coordenador Anderson Collesel, o local já operou como CAPS II, mas por conta do aumento da população e de leitos disponíveis, a unidade tornou-se especializada em casos de dependência com álcool e drogas.
Quando o paciente entra para o atendimento, ele é encaminhado ao grupo de Projeto Terapêutico Singular (PTS) com o acompanhamento de um técnico de referência, que ficará responsável pelo cuidado e acolhimento. Anderson explica que para facilitar os atendimentos, foram criados mini-equipes, que compartilham informações sobre os pacientes que já passaram pelo sistema. “Eles [equipes de referência] é quem vão junto com o paciente estruturar o cuidado, o que vamos fazer, como é que vai ser a reabilitação. Fazem os atendimentos e pensam em quais grupos ele fará parte”, explica.
Atualmente, o CAPS-Ad Uvaranas possui 12 leitos de atenção integral, onde os pacientes podem ficar até 14 dias instalados na unidade para a desintoxicação de substâncias. O serviço oferece refeições de almoço, jantar e café da manhã e medicamentos via Sistema Único de Saúde (SUS).
Estrutura 

Foto: Iolanda Lima

A equipe do CAPS-Ad de Uvaranas é atualmente  composta por 45 profissionais, dentre eles, 20 são técnicos de enfermagem que cumprem turnos de 12×36 horas. O sistema também compreende funcionários de zeladoria e alimentação. De profissionais especializados, nos três CAPS-Ad da cidade funcionam com o quadro de: 18 técnicos auxiliares em enfermagem, 4 enfermeiros plantonistas, 3 psicólogos, 1 educador físico, 1 médico, 1 nutricionista, 3 assistentes administrativos e 7 auxiliares de manutenção predial.
Anderson explica que a equipe já foi maior, mas pela abertura de novos postos de atendimento de saúde mental, como centros de convivência e ambulatórios de rua, os profissionais da equipe foram realocados para outras funções dentro do sistema de Saúde Mental da cidade. Por conta da falta de funcionários, o sistema não consegue criar todos os grupos de PTS necessários para todos os pacientes. Anderson explica que a maioria da equipe fica nos cuidados de atenção integral, enquanto uma parte menor é responsável pelos 320 pacientes ativos no sistema.
A equipe atual, composta em majoritariamente por mulheres, é sobrecarregada de trabalho, o que pode interferir nos atendimento. Nesse contexto, o papel do coordenador se mostra necessário para os cuidados da própria equipe.  “Tudo que eu posso blindar elas, eu blindo. E aí acho que essa é a minha função de tentar cuidar da saúde mental delas. Deixar o caos o mais saudável possível. Senão eu vou sobrecarregar e daqui a pouco vai adoecer. Então, eu preciso deixar o mais leve possível”, confessa o coordenador.
Contudo, um dos motivos dessa sobrecarga é a falta de concursos para psicólogos e técnicos de enfermagem para o sistema dos CAPS. Anderson aponta que todos os profissionais de editais anteriores já foram convocados, logo, o sistema necessita da abertura de novos concursos para ser capaz de oferecer um atendimento mais amplo aos pacientes.
A psicóloga Cristiane Nogare atua há 10 anos no sistema do CAPS. Já atuou no CAPS II, no Ambulatório de Saúde Mental e está desde 2019 no CAPS-Ad. Ela comenta que uma das principais demandas dos pacientes é a vontade de conversar com alguém, mas que pela falta de funcionários especializados, os estagiários acabam dando um suporte para os atendimentos.
Ela alerta que a abertura de concursos deve contemplar outros profissionais também: “A gente está um pouquinho defasado, mas a gente quer que venha profissionais de diversas áreas para compor a equipe. Não é só o psicólogo que vai resolver, que vai dar esse suporte, não é? A equipe multidisciplinar nesse processo é muito importante. Cada um traz o seu olhar, faz o seu acompanhamento”, expõe.
Cristiane conta que viveu a reforma psiquiátrica na cidade, com a mudança de tratamentos, mas que ainda há um estigma da sociedade: “Quando eu olho para trás e comparo com o presente, acho que enquanto equipe do município a gente evoluiu muito. A questão do estigma ainda é uma coisa muito presente. Mas ao mesmo tempo, a nossa população se faz invisível. Por exemplo, o cara que usa crack, ele não quer ser visto.” comenta.
Ela também alerta que parte desse estigma vem de como essa população é noticiada na mídia. Visto que nem todos os usuários são necessariamente ‘bandidos’. A generalização dos casos contribui para o estigma dessa população. Ela conta que atualmente trabalha com as demandas de cada usuário, com estratégias para que cada um alcance o objetivo que deseja, prezando pelo cuidado e atendimento de cada paciente.

“Porque assim, a gente lida, a gente trabalha com pessoas que não são percebidas na sociedade. O CAPS vai ser o espaço de acolhimento deles, o espaço protegido que eles têm.” Independente do que ele fez, do que ele faz.”. Foto: Iolanda Lima

 

Uso de substâncias
A pesquisa do Datafolha realizada em abril de 2025 aponta que 49% dos brasileiros consomem bebidas alcoólicas, sendo 18% admitirem que consomem em excesso  e 7% consomem mais do que deviam. A pesquisa indica que entre aqueles que costumam consumir bebidas alcoólicas, a média de consumo durante uma semana foi cerca de 4,5 doses. Em concordância, o Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas do Ministério da Justiça e Segurança Pública (OBID) possui dados sobre a mortalidade e internações por uso de drogas e álcool. Em 2022, cerca de 12 mil pessoas morreram por complicações relacionadas à bebida alcoólica, doenças do aparelho digestivo foram a maior causa de mortes. Desse número, 2 mil pessoas são do sul do país, que contempla os estados do Paraná, Santa Catariana e Rio Grande do Sul. Já sobre internações por uso de drogas, o OBID indica que no sul, foram mais de 20 mil pessoas internadas por complicações de uso de drogas. A dependência química de drogas é considerada uma doença pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A Rede de Atenção Psicossocial oferece um suporte gratuito para dependentes químicos, que contribui com o cuidado e desintoxicação de substâncias.
Além do cuidado integral, o CAPS oferece projetos sociais, como o ‘Grupo Sentir: Onde cada emoção encontra cuidado’, o podcast ‘Vozes do CAPS’ para pacientes e familiares e o ‘Cine CAPS’ com exibições de filmes e rodas de reflexão.

Reportagem: Iolanda Lima

Foto: Iolanda Lima

Edição e Publicação: Eduarda Breus, Daphinne Pimenta e Joyce Clara

Supervisão de produção: Manoel Moabis e Aline Rios


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