Regulamentação das redes sociais visa diminuir crimes de ódio no Brasil
Segundo a especialista Ana D’Angelo, discursos de ódio e desinformação são as maiores preocupações das leis
As redes sociais fazem parte do cotidiano da sociedade contemporânea. Se por um lado, permitem a interação instantânea, por outro, as plataformas também servem de espaço para a desinformação e discursos de ódio. Neste contexto, discussões em torno da regulamentação das redes sociais acontecem no Brasil e no mundo. Segundo a SaferNet, instituição que atua no combate a crimes contra direitos humanos na Internet, houve o aumento de quase 68% de notificações relacionadas a crimes de ódio online entre 2021 e 2022. Com 874%, a xenofobia foi o crime que mais cresceu de um ano para o outro. Outro indicador é o tempo de uso das redes. A pesquisa Global Overview Report 2023, realizada pelo Data Reportal, site especializado em estatísticas digitais, aponta que o Brasil é o segundo país do mundo que mais gasta tempo diário em redes sociais, com média de três horas e 46 minutos.
Os discursos de ódio são comentários com o objetivo de atacar sujeitos ou grupos minoritários, como pessoas pretas e estrangeiras. Ana D’Angelo, editora do portal Desinformante, aponta que a regulação externa das redes sociais se faz importante perante a insuficiência da autorregulação das próprias empresas. “As redes sozinhas fazem regulação. Quando temos conteúdos removidos, por exemplo, é uma forma de regulação feita pela plataforma, mas a autorregulação se mostrou insuficiente para barrar esses discursos”, afirma. A insuficiência está em não evitar a propagação desse tipo de conteúdo na Internet.
Murilo Maksemiv, de 19 anos, estudante na Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), diz utilizar a internet e as redes sociais como principais fontes de informação. Ele opina que o ambiente online não é seguro por conta do ódio propagado nas redes. “Não se pode descarregar o ódio sobre alguém só porque é desconhecido”, comenta. Como explica Ana D’Angelo, essa realidade ultrapassa o espaço digital. “Não é algo no mundo online, é algo também no mundo real. Vemos consequências ruins de danos e impactos reais na vida da sociedade”, analisa. Estes danos foram percebidos nos atos terroristas de 08 de janeiro em Brasília e nos recentes casos de racismo e apologia ao neonazismo que ocorreram em Ponta Grossa por meio da troca de mensagens entre estudantes dos cursos de Agronomia, em 2022, e Jornalismo em 2023.
A regulação e a regulamentação não acontecem só no Brasil. Outros países tentam regular as atividades das chamadas Big Tech’s como Facebook, Instagram e Twitter, de forma a garantir os direitos dos usuários. A União Europeia, em julho de 2021, aprovou a Lei de Serviço Digital (DSA) e a Lei dos Mercados Digitais (DMA), com o objetivo de estabelecer normas para as plataformas, usuários e mercados online. As medidas entraram em vigor em novembro do ano passado.
Atualmente, o Brasil conta com quatro leis que regulamentam a Internet. O Marco Civil da Internet, aprovado em 2014, é o que garante a liberdade de expressão e evita a censura nas redes sociais. Ana D’Angelo afirma que novas leis podem complementar e atuar em conjunto com o Marco Civil, de forma a responsabilizar as plataformas digitais pelos conteúdos publicados. “A expectativa é que elas façam as atividades por conta própria, com transparência na prestação de contas. Mas o que elas não derem conta de fazer, teremos órgão regulador, Estado e poder judiciário preparados para cobrá-las”, aponta.
O Brasil tem se atualizado para normatizar a atividade online de usuários e das plataformas digitais no país. No início de abril, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino (CIDADANIA – SE), anunciou uma portaria que responsabiliza as redes sociais quando houver veiculação de conteúdos de apologia à violência em escolas brasileiras. A medida foi tomada após frequentes ameaças de ataques a instituições de ensino, fomentadas principalmente no Twitter, vangloriando o ato criminoso.
O país também vive debates sobre o projeto de lei (PL) 2630, proposto em 2020 pelo senador da República Alessandro Vieira (Cidadania – SE). A ‘PL das Fake News’ prevê medidas contra a disseminação de informações falsas em redes sociais e aplicativos de mensagens, e também aspectos envolvendo a regulamentação das plataformas. O texto está sob responsabilidade da Câmara dos Deputados, ainda sem aprovação.
Entrevistado pela Nuntiare, Murilo Maksemiv acredita que a regulamentação será necessária para garantir a segurança online dos usuários. “É positiva. Assim, o governo ou alguma entidade pode intervir sobre isso para transformar a internet em um ambiente mais seguro”, analisa. Para Ana D’Angelo, “com uma legislação perene e realizada em consonância com as sugestões dos três poderes, a expectativa é que possamos ter bons resultados em relação às redes sociais”, aponta.
Ficha Técnica
Reportagem: Vinicius Sampaio
Fotos: Marcella Panzarini e Vinicius Sampaio
Edição e Publicação: Lucas Ribeiro
Supervisão de produção: Luiza Carolina dos Santos
Supervisão de publicação: Cândida de Oliveira e Muriel E.P. Amaral