Toda aula de História tem como objetivo instigar os interlocutores ao conhecimento. Por meio da provocação inicial — seja através da leitura textual, interpretação de imagens, ou pelo diálogo — os envolvidos pelo processo de aprendizagem são convidados a problematizar os eventos históricos. Dessa forma, um pouco da profissão do historiador pode ser experimentado.
Um exemplo de aula de História, para além das salas de aula, pode ser encontrado visitando a exposição Múltiplo Leminski. A partir dela, por exemplo, podemos percorrer fases importantes da história do Brasil, do Paraná, da imigração, da literatura, da cultura, dos intelectuais, entre outros.
A ESCRITA COMO HERANÇA
Se, por um lado, os traços paternos de Paulo Leminski nos possibilitam um mergulho na história da imigração; por outro, a genealogia materna do escritor nos permite uma viagem ao período em que o Brasil esteve vinculado à Corte portuguesa.
Fernando Pereira Mendes, avô materno de Paulo, trazia em seu sangue a descendência portuguesa. Paulista de nascimento, veio ao Paraná para exercer sua profissão de militar, prestando serviços ao Exército Brasileiro vinculado à 5ª Região Militar, sediada em Curitiba. Quando o tempo lhe permitia, tinha o hábito de escrever alguns textos e consequentemente os publicava em jornais paulistanos. Essa prática se mostrará muito importante para a construção do neto poeta.
PARANAGUÁ, ANTONINA E OS POVOS ORIGINÁRIOS
Por sua vez, Inocência Abreu, avó materna de Paulo, descendia de negros e indígenas, sendo filha de pais oriundos da região litorânea paranaense (Antonina e Paranaguá). De certa forma, ela se configura no elo entre o litoral, os europeus e os africanos que ali se fixaram nos Seiscentos e os primeiros habitantes daquela extensa faixa territorial.
Ocorre que sobre os nativos da região, a historiografia enfrenta um debate interno acalorado. Ripari e Fernandes (2018) trazem uma pesquisa interessante para auxiliar na compreensão do grupo originário que ocupava o litoral Sul, especialmente o paranaense. Na pesquisa, a denominação Carijó aparece como termo usado por viajantes para se referirem aos indígenas ali instalados, que assim se reconheciam e pelos outros eram reconhecidos. Outras interpretações sobre esse grupo autóctone, dizem ser Carijó os povos Guarani, porém, como mencionam os autores “é impossibilitada dentro das circunstâncias uma afirmação categórica, nos deixando apenas a possibilidade de apontamentos” (RIPARI e FERNANDES, 2018, p.6).
Do casamento de Inocência Abreu e Fernando Pereira Mendes, nasceu Áurea Pereira Mendes, a mãe do poeta. Os traços maternos que remontam os desdobramentos do processo complexo e tenso da colonização, bem como as origens paternas feitas a partir da conturbada imigração polonesa nos fins dos Oitocentos, fizeram de Paulo Leminski um importante ator social de seu tempo. Tal condição foi interpretada pelo poeta curitibano de modo autêntico, fator determinante em sua trajetória, pois “com a autoridade de ter nascido na cidade, ser neto de imigrantes poloneses, misturado com sangue indígena e negro, Leminski batia pesado na cultura local. Achava-a moralista, careta, avara, fria, centrada no trabalho e no consumo” (LOPES, 2018, p. 118).
Referências
LOPES, Rodrigo Garcia. Roteiro literário Paulo Leminski; fotos de Eduardo Macarios. – Curitiba, PR : Biblioteca Pública do Paraná, 2018. 180 p. ; 21 cm. – (Biblioteca Paraná).
Disponível em: >https://www.bpp.pr.gov.br/sites/biblioteca/arquivos_restritos/files/documento/2021-03/roteiro_literario_paulo_leminski.pdf<. Acesso em 01 de set. de 2021.
RIPARI, Angélica; FERNANDES, F. R.. Carijós – reavivando a agency indígena. In: 31ª RBA – direitos humanos e antropologia em ação, 2018, Brasília. Anais da 31ªRBA, 2018.
Pesquisa e texto: Ricardo Enguel Gonçalves, especial para o Museu Campos Gerais.