Uma noite de acolhimento
Em Ponta Grossa, abrigo tem capacidade de atender até 70 pessoas por noite
Às 17 horas começa a nossa busca pela Casa de Acolhimento Municipal Maria Isabel Ramos Wosgrau, localizada entre as ruas Barão de Teffé com a Generoso Marques dos Santos, na região central. O espaço leva o nome da ex-primeira dama da cidade, já falecida, como forma de homenagem pelas campanhas e projetos de assistência social que realizou. O albergue foi inaugurado no dia 09 de junho deste ano, pela Prefeitura de Ponta Grossa.
Após colocarmos o endereço no GPS do celular, seguimos a rota indicada e em seis minutos encontramos o abrigo. Esse primeiro contato foi apenas para conhecer o local onde passaríamos uma parte da noite. Nesta passagem, conseguimos localizar duas pessoas em situação de rua que, ao que parece, já estavam esperando o albergue abrir, o que acontece às 20 horas. A primeira estava deitada próxima à porta do local, dormindo. Já a segunda, estava na esquina, deitada em um terreno baldio.
Partindo da casa de uma das repórteres, verificamos que segundo o GPS, o caminho levaria oito minutos de carro e 43 a pé. Com essas informações, às 19h22, saímos rumo ao albergue. Ao chegar no local, observamos que havia 13 pessoas esperando o abrigo abrir, duas dessas eram mulheres. Nota-se que muitos dos que estavam na fila pareciam dependentes químicos. Havia até mesmo um que alucinava ter quebrado o braço e não poderia trabalhar no outro dia.
Na própria fila, os acontecimentos ocorrem diante dos nossos olhos. Um deles foi um homem que, voluntariamente, estava entregando pacotes de bolacha para todos na fila. Nesse momento, uma das pessoas que recebeu o alimento disse:
– É bom que recebemos bolacha, porque quando der fome de madrugada podemos comer.
Outro momento marcante foi uma mulher que levou um par de sapatos para uma senhora que estava na fila aquecer seus pés, já que a temperatura nesta noite era de 16°.
A primeira conversa foi com um senhor de 62 anos, que está em situação de rua há quatro anos. Ao longo do diálogo, ele relatou que está na rua por questões familiares, pois, de acordo com ele, algumas pessoas da sua família possuem algumas “perturbações”, o que dificulta o convívio. Já o segundo, um homem que aparentava ter mais de 40 anos, por condições financeiras está há algum tempo nas ruas, até conseguir dinheiro para alugar um local.
No decorrer da noite, chegou uma mulher procurando seu filho que estava desaparecido há um dia. De acordo com ela, o jovem saiu de casa após eles brigarem e ela expulsá-lo. A esperança da mãe era de que o rapaz fosse para a casa do pai, mas como soube que ele não estava lá, resolveu procurar no albergue e em outros pontos da cidade, já que o filho tem um histórico com drogas.
Às 20h, o albergue abriu. Foi possível observar que para entrar ao local há a necessidade de ter uma ficha com nome e data de nascimento, que é realizada na primeira vez em que os moradores vão até o local. Para fazer o cadastro é solicitado qualquer documento oficial ou, caso tenham perdido, solicitam um boletim de ocorrência, caso também não tenham, a equipe de abordagem social faz a ponte junto ao Instituto de Identificação para regularizar a documentação. Em seguida é feita uma revista para confiscar bebidas alcoólicas e armas brancas, não há a vistoria de drogas, pois necessitaria de uma busca minuciosa. Após essa etapa, passam álcool em gel e recebem máscaras. Durante a noite foram chegando mais pessoas, mas não atingiram a capacidade total do espaço, que é de até 70 moradores em situação de rua.
Na fila para entrar, as pessoas em situação de rua interagiam com a assistente social e os seguranças do local. A assistente pergunta quais são os planos do morador para o futuro, eles conversam e fazem piadas de forma descontraída. Entre esses diálogos, um homem relata que seu cachorro foi envenenado, enquanto conta, tenta dar bolacha para outro animal que estava ali, neste momento um homem grita:
– Cachorro não come bolacha, come carne.
Percebe-se o nível de intimidade deles quando sentem a falta de uma das pessoas que costuma frequentar o abrigo. Pelos comentários que ouvimos, tais como: “cadê fulano?”, “pela tarde ele estava no terreno baldio”, “ele sempre fica por ali”, acreditamos ser o mesmo homem que estava no local quando passamos a tarde. Nesse momento foram procurá-lo no terreno em frente ao abrigo, mas encontraram apenas sua coberta.
Para mais informações leia a revista laboratorial do curso de jornalismo da Universidade Estadual de Ponta Grossa, Nuntiare.
Ficha técnica:
Reportagem e infográficos: Deborah Kuki e Larissa Godoi
Edição e Publicação: Deborah Kuki e Larissa Godoi
Supervisão de produção: Marcos Zibordi
Supervisão de publicação: Candida de Oliveira e Muriel E. P. Amaral