Música em Ponta Grossa durante a Ditadura Militar

Música em Ponta Grossa durante a Ditadura Militar

Quando falamos sobre música na ditadura militar brasileira, canções como “Pra Não Dizer Que Não Falei das Flores” (1968), de Geraldo Vandré, “É Proibido Proibir” (1968), de Caetano Veloso, e “Cálice” (1973), de Chico Buarque, são três exemplos bem conhecidos haja vista que tiveram sua circulação proibida por todo o Brasil. Contudo, apenas o processo de censura nas grandes cidades é estudado , ao passo que em municípios de menor porte, por exemplo, a maneira como se dava a proibição da execução de músicas no período 1964-1984 foi pouco investigada. Assim, a partir  de uma entrevista realizada com o jornalista e radialista Erondi Milléo e também com o Jornalista e Artista Visual Sebastião Natálio (Sebas), compreendemos um pouco como se deu esse processo na cidade de Ponta Grossa em determinados momentos do período do regime militar; seus depoimentos revelam, também, quais tipos de músicas tocavam nas emissoras de rádio naquele período.

Segundo o jornalista e radialista Erondi Milléo, que trabalhou na Rádio Sant’ana de Ponta Grossa e que vivenciou os anos de intensa repressão no que diz respeito à música, “a fiscalização foi muito rigorosa”, sendo que o Departamento Nacional de Telecomunicações (DENTEL) era a agência responsável pela vistoria de censura. Ele afirma que os censores “chegavam de surpresa para exigir um relatório que constasse absolutamente tudo o que a rádio havia tocado ao público nos últimos 90 dias, além dos registros e gravações de todas as pessoas que foram entrevistadas pela emissora”.

No que diz respeito aos principais gêneros musicais que tocavam pela cidade de Ponta Grossa, Erondi Milléo afirma que as canções nacionais (desde que não estivessem na lista das proibidas) eram incentivadas pelo governo e o gênero poderia ser tocado sem maiores problemas, tendo em vista que o governo tentava a todo custo incentivar o orgulho nacional. Canções de bandas como Bee Gees, Scorpions e The Beatles, por exemplo, não deveriam ser executadas e o sertanejo, por sua vez, era o principal gênero solicitado pelos ouvintes, com duplas sertanejas como Tonico e Tinoco, Pedro Bento e Zé da Estrada e Nenete e Dorinha,entre outras.

Erondi Milléo afirma que, como discotecário, possuía uma lista das canções que não poderiam ser tocadas. Quando alguém as solicitava, ele precisava explicar ao ouvinte em questão que seu pedido deveria ser trocado, pois a música solicitada estava na censura e, por isso, não poderia ir ao ar. Ele relembra que músicas como “Que as Crianças Cantem Livre” (1973), de Taiguara, “Apesar de Você” (1970) e “Cálice” (1973), de Chico Buarque, e “Tiro ao Álvaro” (1960), de Adoniran Barbosa e gravada por  Elis Regina em 1980, por exemplo, eram títulos que não deveriam ser tocados. O jornalista e artista visual Sebastião Natálio (Sebas) explica os porquês dos censores se incomodarem com tais canções: no caso de “Cálice”, foi o uso de metáforas religiosas; e, no caso de “Tiro ao Álvaro”, a “falta de gosto”.

No que se refere a relação entre a música e os eventos pontagrossenses, Erondi Milléo afirma que, uma vez por ano, acontecia uma exposição agropecuária em que algum artista sempre vinha para realizar um show, sendo que ele teve a oportunidade de entrevistar Nelson Gonçalves, Celly Campello, Sérgio Reis, Wanderley Cardoso e Moacyr Franco, os quais, por sua vez, segundo o Jornalista e Radialista, cantavam “aquilo que se podia”, sem, no entanto, expressar descontentamentos.

Por fim, Milléo relatou que sempre teve muito cuidado em relação ao que deixar ou não ir ao ar, e que também via as pessoas à sua volta, que lidavam com o mesmo ramo, com a mesma preocupação. Aparentemente, todos entendiam a seriedade das possíveis consequências das autoridades. Segundo ele, no regime militar muitos dos profissionais de comunicação que atuavam em rádios de cidades do interior respeitavam as regras de censura impostas também em função do medo de vivenciarem possíveis represálias no ambiente de trabalho.

 

Referências:

Entrevista realizada com: MILLÉO, Erondi. Tema: a música em Ponta Grossa, durante a Ditadura Militar. Realizada por: BERNARDES, Elizandra. Ponta Grossa, julho. 2023.

Entrevista realizada com: NATÁLIO, Sebastião. TEMA: a música em Ponta Grossa, durante a Ditadura Militar. Realizada por: BERNARDES, Elizandra. Ponta Grossa, julho. 2023.

 

Autora: Elizandra de Jesus Bernardes

Acadêmica do 2° ano do curso de Licenciatura em História, UEPG

Ano: 2023

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