Micro Museu une história e biologia para entender a pandemia

Desenvolver estratégias de inteligibilidade da pandemia de Covid-19 em perspectiva histórica tem sido o objetivo do projeto Micro Museu. O grupo coloca em conversação, desde 2020, junto ao Museu Campos Gerais, setores do conhecimento e distintas áreas de aplicação da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e de instituições colaboradoras.

O resultado mais recente das ações, em dois anos completos de pandemia, é um vídeo que permite um olhar aproximado da entrada do novo coronavírus no corpo humano. A animação faz parte do Trabalho de Conclusão de Curso de alunos do Curso de Engenharia de Computação da UEPG e integra ação educativa do museu.

Encontro de saberes

Para compreender um pouco mais sobre a contaminação do coronavírus, a equipe do MCG se reuniu com os professores Marcos Pileggi, do Departamento de Biologia Estrutural, Molecular e Genética, e Maurício Zadra Pacheco do Departamento de Informática da UEPG. Durante a conversa surgiram observações relativas à história do tempo presente, que traz memórias de outras pandemias, percepções relativas à atual situação e questionamentos do que virá daqui para frente.

Os questionamentos foram aprofundados em evento do ano passado do Programa de Pós-Graduação em Jornalismo dentro da 19ª Semana Nacional de Museus do MCG. Pesquisadores do Jornalismo, da Microbiologia, da História e das Artes buscaram oferecer perspectivas combinadas de análise da pandemia. Assista ao vídeo. 

Uma das questões apontadas foi a dificuldade que a sociedade tem em compreender o que é afinal o coronavírus. Assim surgiu a ideia de elaborar um vídeo para mostrar visualmente como a Microbiologia explica a contaminação.

Vírus animado

Para criar a animação (link), os alunos Daniel Siemieniaco e Gulliver Waldmann, ambos do curso de Engenharia de Computação, se dedicaram a entender o ciclo de reprodução do vírus para traduzir de forma visual e dinâmica como ocorre esse processo. Todo este estudo oportunizou o trabalho interdisciplinar entre as equipes dos professores que compõem o projeto de extensão Micro Museu junto ao MCG.

O vídeo provoca questões da microbiologia que foram pontuadas por Patricia Camera, diretora de ação educativa do MCG.

Quem explica é o professor Pileggi, pesquisador na área, com atuação no Hospital Regional durante a pandemia e que acompanhou o mapeamento genético do vírus.

– Professor, o que estou observando nesse vídeo?

Esse vídeo mostra o ciclo de reprodução do coronavírus dentro das células humanas.

– Mas o que é um vírus?

Vírus é um microrganismo composto de material genético envolto numa cápsula feita de proteínas ou na forma de membranas. Não apresenta organelas, portanto não consegue se alimentar, produzir energia e excretas sozinho. Por isso, ele depende de outras células para se reproduzir, normalmente causando doenças nesse processo.

– Por que o coronavírus tem esse nome?

Esse vírus é envolto por uma membrana lipídica que contém proteínas inseridas. Algumas dessas proteínas se projetam para fora da membrana, formando os espigões, ou spikes, com a função de reconhecer receptores nas membranas das células humanas. Eles dão um aspecto de coroa envolvendo o vírus. Em latim, coroa é corona, daí o nome, vírus com coroa. Uma vez que os spikes são estruturas externas, podem ser reconhecidos pelo sistema imunológico.

– Qual o tamanho do coronavírus quando comparado ao grão de areia?

O vírus tem um tamanho que varia entre 50 e 140 nm. Um nanômetro é a milionésima parte do milímetro. E um milímetro é o tamanho médio de um grão de areia. Ou seja, um grão de areia é aproximadamente 10.000 vezes maior que o coronavírus. Se o vírus fosse uma pessoa, o grão de areia seria o Everest, mais ou menos. Uma célula, em média, é 1.000 vezes menor do que o grão de areia. Colocando novamente uma pessoa como se tivesse o tamanho do coronavírus, uma célula teria o tamanho do World Trade Center.

– Como esse vírus infecta nossas células?

Pelo reconhecimento de receptores nas células humanas pelos spikes, que são as estruturas da coroa do coronavírus. Uma série de reações ocorrem, e possivelmente com a fusão das membranas do vírus e da célula, o material genético do vírus penetra no interior da célula humana, em seu citoplasma.

– O coronavírus tem uma receita de como produzir novos vírus dentro das nossas células?

Sim, a mesma de todos os seres vivos, que é o seu material genético. Mesmo sendo uma molécula de fita simples de RNA, ali está o código para a construção de proteínas e montagem das estruturas do vírus.

– Quais são as explicações sobre como os vírus causam problemas para as nossas células?

De uma maneira geral vírus utilizam o metabolismo das células hospedeiras para se reproduzirem, podendo, nesse processo, inviabilizá-las. Durante o processo de liberação de novos vírus, esses podem romper e destruir a célula hospedeira. No caso desse coronavírus, as modificações que ele provoca quando invade uma célula acabam enganando o sistema imunológico, que só terá alguma reação quando muitas células já foram infectadas. E essa reação pode ser equivocada, matando várias células saudáveis. Os receptores para o coronavírus se encontram em várias células do corpo, portanto, podendo ser atacadas. Os pulmões normalmente são os mais afetados por serem os primeiros órgãos a entrarem em contato com o vírus.

Para aprofundar o que se vê no vídeo: entenda a contaminação pelo coronavírus

Segundo os estudos realizados pela Microbiologia, estruturas externas ao coronavírus, as proteínas spikes (S), são as responsáveis pela ligação do vírus com as membranas das células que irão infectar. Essas proteínas são como portas para os vírus entrarem nas células. Diferentes proteínas compõem a membrana do vírus, sendo as principais a hemaglutinina-esterase (HE) e a estrutural de membrana (M).

Assim que o vírus se liga aos receptores, provavelmente ocorre a fusão da membrana do vírus com a membrana da célula que está sendo infectada, liberando o material genético do vírus para o interior da célula, o citoplasma. Esse material genético é uma molécula de RNA fita positiva, assim chamada pois tem as funções de genoma, que no ser humano é o conjunto de todo DNA que está dentro das nossas células, mas no caso do coronavírus, o genoma é constituído de RNA e de RNA mensageiro, que é uma molécula fundamental para a produção de proteínas nos seres vivos. Uma série de eventos moleculares é induzida pelo vírus de modo a protegê-lo das defesas celulares, como endocitose, que é um mecanismo da célula onde ela vai englobar o vírus com sua membrana e destruí-lo.

No citoplasma, a fita de RNA do vírus irá se ligar aos ribossomos, que são organelas da célula que funcionam como fábricas/montadoras de proteínas, e produzir a enzima RNA polimerase viral, que terá a função de produzir novas moléculas de RNA do vírus somente. Essa enzima irá produzir moléculas de RNA fita negativa, tendo como molde a fita positiva do vírus. De maneira semelhante, a RNA polimerase viral irá utilizar a fita negativa como molde e produzir novas fitas positivas de RNA, que serão o genoma de novos vírus; e fitas de RNA subgenômico, que irão sintetizar proteínas que serão incorporadas aos vírus em formação. Então a fita negativa é apenas um molde para se produzir as moléculas de RNA que irão produzir proteínas, ela é uma molécula que só serve para isso, não produz proteínas.

Os RNA subgenômicos que codificam para as proteínas que protegem o RNA dentro dos vírus, os nucleocapsídeos (N), serão traduzidos nos ribossomos da célula e se ligarão as fitas positivas recém-sintetizadas, formando o complexo genômico do vírus. Só para lembrar, essas fitas positivas longas são as mesmas que estão nos vírus. É o material genético do coronavírus. Já os RNA subgenômicos que codificam para as proteínas estruturais do vírus, como as proteínas S, HE e M, se ligam aos ribossomos que fazem parte do retículo endoplasmático rugoso, que é um sistema de membranas dentro da célula, onde são montadas as proteínas que serão excretadas para outros tecidos do organismo. Assim que sintetizadas, essas proteínas farão parte da membrana do retículo.

Na montagem dos novos vírus, o complexo do RNA fita positiva e nucleocapsídeos serão englobados no local da membrana do retículo endoplasmático que contém as proteínas S, HE e M. Assim, esse local será transformado em membrana do vírus, englobando o material genético viral e contendo as proteínas virais que permitirão se acoplar a novas células hospedeiras. Esses novos vírus serão englobados por uma outra camada de membrada do complexo de Golgi, que é o sistema de membranas que irá levar as proteínas para fora da célula, onde elas executarão suas funções, sendo transportados até a membrana citoplasmática. Os vírus se aproveitam desse sistema de membranas para pegar carona para fora da célula. A membrana mais externa do vírus, que ele adquiriu no complexo de Golgi, se funde a membrana da célula, liberando os coronavírus com apenas uma membrana que ele adquiriu no Retículo Endoplasmático Rugoso. Os vírus estarão funcionais e prontos para infectar novas células ou novos hospedeiros. E então o ciclo recomeça.

Tem mais?

Sim. Para o mês de março, o professor Marcos Pileggi promete evento que vai reunir PPGs de diferentes áreas para pensar intervenções da universidade na pandemia. Mais informações em breve.

Texto: Patricia Camera e Marcos Pileggi

 

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